Apesar de repetirmos amiúde que o mundo é global e que as decisões tomadas em Katmandu podem influenciar a vida em Grândola, a verdade é que, no fundo no fundo, não acreditamos muito nisso. Eu mesmo publiquei neste espaço uma coluna louvando a invejável posição de Portugal na liga das nações, como se a nossa sorte dependesse total ou maioritariamente de nós próprios.

Mas, de repente, fui acordado para a realidade. Segundo o IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change, o mundo tem 12 anos para inverter, de forma dramática, a libertação de gases de estufa para a atmosfera. As conclusões são claras: se não limitarmos o aumento da temperatura a 1,5°C relativamente à era pré-industrial, um mero meio grau mais levará ao desaparecimento dos insetos necessários à polinização e as plantas verão duplicar a possibilidade de perda do seu habitat; 99% dos corais desaparecerão; e dias de extremo calor como os que se viveram estes anos no hemisfério norte passarão a ser a norma.

O oceano Ártico, cuja navegação apenas é possível em ciclos de cem anos, passará a sê-lo de dez em dez. E os oceanos perderão três mil milhões de toneladas de peixe, o dobro da perda se o aquecimento ficar pelo nível inferior. O dobro de pessoas será submetida a “water stress” e a pobreza extrema. Os refugiados que nos chegam fugindo da guerra acrescentarão a fome, a seca e a doença às razões que os levam a fugir das suas terras. Tudo isto com apenas meio grau mais. Mas, mantendo-se a tendência atual, a temperatura não subirá nem 1,5, nem 2, mas sim 3 graus centígrados até ao fim do século. Podemos imaginar as consequências.

Jair Bolsonaro encaminha-se a passos largos para se transformar no futuro presidente do Brasil. Uma das suas promessas eleitorais é a abertura da floresta da Amazónia à exploração agrícola. A Amazónia é o maior sumidouro de dióxido de carbono do mundo. Tal como Bolsonaro, Trump também já decidiu facilitar os limites impostos às centrais de carvão nos EUA que assim vão libertar 12 vezes mais dióxido de carbono para a atmosfera na próxima década do que o limite imposto por Obama. Mas, também a Grã-Bretanha se prepara para legalizar o “fracking”, a muito ecológica Noruega fala em explorar petróleo no Ártico e a Alemanha pondera derrubar uma floresta histórica para extrair carvão do seu subsolo.

Portanto, é desta. O que o Bolsonaro fizer à Amazónia vai mesmo prejudicar o meu neto Luca, mesmo que ele nunca ponha os pés no Brasil. Infelizmente, talvez mesmo o meu filho Filipe, pai do Luca, já tenha que deixar Cascais para se refugiar nas faldas da Estrela, acossado pela subida do mar, pela falta de água devido à salinização crescente dos lençóis freáticos e pelos furacões que vão fustigar as nossas costas. A questão já não é tanto preocupar-nos com a sorte dos nossos netos. São mesmo os nossos filhos que estão em perigo. E esse perigo vem na forma das decisões políticas que tomamos, no Brasil como na Noruega.

Afinal é mesmo verdade: quando uma borboleta bate as asas na América, um tufão desabará sobre a China. Neste caso a borboleta chama-se Bolsonaro e gosta de empunhar metralhadoras.

Mas quero terminar com uma palavra de esperança. Já há quem proponha dispersar milhões de toneladas de dióxido de enxofre na atmosfera (chama-se “geoengenharia”) para limitar a subida da temperatura. O que está por esclarecer é o que poderá acontecer quando esse enxofre todo começar a chover nas nossas cabeças…