A aparente encruzilhada em que se encontra o processo do Brexit no Parlamento britânico deve ser gerida, com proveito e sapiência, pela União Europeia.

As sucessivas rejeições dos mais variados tipos de acordos não encaminham, necessariamente, e no nosso entender, para a irreversibilidade do processo de saída do Reino Unido, como tantos querem crer ou fazer crer.

Percebemos que aqueles que durante dois anos se empenharam nos acordos, procurando fixar as condições de saída, sintam alguma frustração face a um possível retrocesso.

Já é menos compreensível o número daqueles que, aproveitando aquilo que pensamos ser um ato irrefletido dos britânicos, e sem o dizer expressamente, desejam em segredo que o Reino Unido abandone a União Europeia, repescando a histórica oposição gaullista a uma União “com os ingleses”.

Todos os que têm a profunda convicção que esta saída é um erro – não apenas para o Reino Unido mas para o próprio projeto europeu, podendo dar início a um processo de desagregação que será difícil de conter –, não podem acomodar-se na alternativa entre uma “boa saída”, que seria uma saída com acordo, e uma “má saída”, que seria uma saída desordenada. Qualquer destas duas alternativas é demasiado má para nos acomodarmos a elas.

Se a política, em particular a errática política parlamentar britânica, dificulta atualmente uma saída com acordo, continuamos a acreditar que uma saída sem acordo é mesmo uma impossibilidade.

Se acreditarmos que a insanidade ainda não colheu por completo os responsáveis políticos britânicos, e que não vão cometer suicídio, haverá bom senso suficiente para não agravar a situação. Isto significa que, em plena crise, qualquer busca de solução implica dar tempo.

É absolutamente essencial que, sem ultimatos, sem declarações solenes e sem pretensos prazos intransponíveis, a UE perceba que tem de dar tempo para que a conjuntura política britânica se clarifique, nomeadamente através de eleições. É crucial que o Reino Unido consiga determinar uma posição sustentável e claramente assumida enquanto Estado soberano, o que neste momento não existe.

Até lá, continuemos a trabalhar nos planos de contingência e a preparar as empresas e as pessoas para os cenários mais negativos. Mas tenhamos em mente que é redutor pensar apenas na contingência das nossas relações futuras com o Reino Unido. Com o Brexit, haverá que repensar todo o quadro de relacionamento no interior da União Europeia.

A Europa, os analistas, os políticos e as empresas deveriam fazer análises mais aprofundadas e debates mais centrados no futuro da União sem o Reino Unido. Mas o pensamento principal, neste momento, deveria ser que a permanência do Reino Unido seria bem-vinda.