Num contexto de crescente polarização da cena internacional, o presidente Lula da Silva escolheu o campo onde entende que o Brasil se deve doravante situar. Escolheu francamente mal. A aposta no alargamento e aprofundamento dos BRICS, que elogiou e que tenciona promover, é um erro de consequências não mensuráveis ainda, mas seguramente graves para o seu país e para o mundo.
Regressando ao esquerdismo militante das origens, Lula justifica-se com os argumentos coçados da esquerda anti-colonialista, pretendendo que uns BRICS reforçados porão termo “à prepotência do senhor do engenho contra o escravo”, que o mesmo é dizer, ao predomínio do Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, nos assuntos mundiais. Desta forma, anuncia com solenidade, que este arranjo no cenário internacional, mais não visa do que no nobre propósito de “criar um mundo mais justo e solidário”. Só não se percebe como.
Os BRICS reúnem algumas das ditaduras mais repressivas do planeta e preparam-se para adicionar mais algumas, não se percebendo como pretendem construir um mundo mais justo, quando internamente são profundamente injustas e externamente semeiam injustiças, como a Rússia na Ucrânia ou a China, porventura num futuro não longínquo, em Taiwan.
Por outro lado, é um grupo desconexo de Estados, com interesses diversos e até conflituantes – excepto no seu ódio visceral ao Ocidente e em particular aos Estados Unidos e aos valores que representam, no fundo, o único factor que os une – e pouco propensos à cooperação, pelo que não se espera que estimulem a solidariedade.
Ao afastar-se do Ocidente, Lula revela, além do mais, uma total contradição nas políticas externa e interna do seu governo. Se externamente namora ditaduras, internamente proclama os valores de liberdade, tolerância e de consciência ambiental característicos das democracias. Como pode Lula defender a democracia e o pluralismo ao mesmo tempo que corteja a Rússia, a China, o Irão ou a Arábia Saudita?
Mais. Como pode apelar à tolerância e ao respeito pelas minorias quando se senta à mesa com países que perseguem os seus cidadãos por motivos religiosos, de orientação sexual ou étnicos? Como pode defender a Amazónia e, ao mesmo tempo, trocar abraços com os representantes de alguns dos maiores poluidores do planeta e que pouco caso fazem do assunto?
Somente com o penhor da sua credibilidade e coerência, que aparentemente se dispõe a desbaratar, num bric-à-brac político, confuso e contraditório, que faz de si um sério candidato a populista, pois a falta de credibilidade e de coerência são dois traços característicos dos políticos desse calibre. Se a maior virtude de Lula era a de não ser Bolsonaro, corre sérios riscos de acabar na mesma categoria deste.
O Brasil, abençoado por Deus como diz a canção, merecia melhor sorte. A “terra prometida”, como lhe chamava o marquês de Bombelles, embaixador de França na corte de D. Maria I, parece fatalmente condenada ao mau governo.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.