As últimas eleições foram altamente punitivas para a direita. A eleição de deputados por duas novas formações políticas deste espectro decorre mais desta punição do que de uma contestação à esquerda dominante.

A falta de eficácia e de credibilidade da resposta do PSD e do CDS às expectativas dos diferentes sectores da sociedade que determinam as grandes escolhas eleitorais, foram evidentes e de resultados avassaladores. Tal não tira o mérito aos dois novos partidos de direita com representação parlamentar, nem diminui o interesse de um maior pluralismo no Parlamento com melhor identificação dos novos protagonistas.

Logo na noite eleitoral, o CDS  entrou num processo tão penoso quanto os resultados que teve. Com grande parte da nomenclatura de Assunção Cristas a descolar de tudo o que tinha idealizado e validado nos últimos três anos e meio, logo se começou a forjar a candidatura que proporcionasse a perpetuação do grupo que, vindo do núcleo duro portista, e tendo estado no centro da gestão Cristas, se pauta mais por estratégia de sobrevivência do que por qualquer projecto político consistente.

É verdade que os partidos políticos existem para exercer e condicionar o poder, mas este poder deve ser exercido em função de uma doutrina vertida num programa de acção; a questão da sobrevivência do grupo reduz e subverte este princípio. Numa reflexão séria sobre o futuro da direita, e de todo o sistema, a pergunta a fazer deverá ser que CDS fará sentido hoje e no futuro. De que modo pode o CDS ser central e uma escolha a considerar pelos eleitores de modo consistente?

O recurso a nichos que proporcionam crescimento rápido, mas pouco sustentado, usado com sucesso no passado por Monteiro e Portas não é uma opção. Já temos, e poderemos ter mais, partidos de nicho; não é essa a vocação do CDS. A preocupação do CDS deverá ser uma resposta global credível alternativa ao socialismo, não a cobertura de tendências sociais que valem 20% dos seus já poucos deputados.

É verdade que a história do CDS é rica, e que mais de quatro décadas de participação na vida da democracia portuguesa é um activo valioso. É também verdade que este património só se valoriza se o partido encontrar um lugar no futuro do país. A reflexão a fazer implica compreender que partido, considerando a sua matriz ideológica, está mais preparado para as questões que se põem e porão à sociedade.

Numa época em que a esquerda liquida paulatinamente o Serviço Nacional de Saúde, quem poderá com propriedade defender a sua sustentabilidade e qualidade? Num tempo de tensão social evidente, quem melhor poderá promover o encontro entre partes, defendendo a dignificação urgente do salário mínimo de modo sustentável? Na precipitação de uma nova estratificação social, com a extinção à vista da classe média e média-baixa, quem poderá propor políticas sociais eficazes que contrariem e corrijam esta tendência geradora de desigualdades?

Face à insegurança e incerteza, quem poderá oferecer tranquilidade sem clivagem e exclusão social, sem perder de vista a lei e a ordem? Sabendo do papel estruturante do ensino no futuro do país, quem pode assegurar uma escola exigente e de qualidade, capaz de preparar as novas gerações para os desafios do futuro? Quem, pelos princípios exigentes que escolheu desde a fundação, está mais apto para ajudar na imprescindível credibilização da justiça?

A estas perguntas perenes, há novas perguntas fundamentais a fazer no espaço da direita, ligadas ao presente e com os olhos esclarecidamente abertos para o futuro. O conservadorismo democrata-cristão, ao invés do liberalismo, é tradicionalmente ecologista; que visão sensata, mas ambiciosa, pode o CDS apresentar em termos de preservação do ambiente e sustentabilidade no longo prazo?

O humanismo democrata-cristão tem o homem no centro de toda a acção política e social; quem poderá melhor equacionar as futuras relações de trabalho, fiscalidade e remuneração num panorama de automação crescente, com cada vez menos necessidade de mão-de-obra humana? Num panorama de mudança de respostas sociais, quem poderá enquadrar melhor a iniciativa individual de cuidadores e assistentes, reforçando os laços familiares e sociais? No primado actual da economia sobre a política, quem poderá, à direita, mais convictamente defender uma sociedade de bem-estar centrada no indivíduo?

Portugal poderá não ficar muito mais tempo fora das grandes rotas migratórias. Quem estará mais apto para abordar esta questão sensível sem perder de vista o ser humano, mas sem a irresponsabilidade ideologicamente induzida da esquerda? Enquanto a esquerda ensaia um revisionismo histórico capaz de minar a relação de Portugal com os países irmãos da CPLP, e a confiança e bem-estar entre portugueses de diferentes proveniências; quem assegurará sem complexos uma ideia de portugalidade inclusiva e dialogante?

A todas estas perguntas, o CDS, caso queira e decida, poderá dar uma resposta satisfatória e diferenciada. Depois de diversas incursões errantes em diferentes alturas, o CDS tem margem para regressar aos princípios fundamentais da democracia cristã, porque são o seu tronco fundador. Com novos protagonistas e o compromisso de união do partido no essencial, as propostas do CDS não terão grande dificuldade em encontrar acolhimento numa faixa considerável da sociedade.

É um caminho de grande exigência, que prevê a renúncia a muitos vícios acumulados ao longo dos tempos. A confiança dos eleitores exige constância e credibilidade, levará tempo e muito empenhamento. Se houver quem queira seguir este caminho, o CDS vale a pena. Se persistir em mais do mesmo, será um penoso caminho até à morte anunciada.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.