O ano começa e com ele a primeira das decisões que grande parte de nós tem de tomar: quem eleger como representante parlamentar. Estava a pensar sobre este tema – com a surpreendente pouca vontade de acompanhar os debates televisivos entre os cabeças de lista – enquanto “A mulher do cacilheiro”, da Capicua, me recentrava a mente.

Será que aquela mulher – não branca, com trabalho indiferenciado, que acorda antes de todos e que prepara o dia de grande parte dos eternos líderes do país – se sente representada pelos membros que o Parlamento português tem tido? E pelos potenciais novos parlamentares – mais velhos, porque repetidos – que as listas dos partidos anunciaram? Não sei. Não é o meu lugar de fala, mas desconfio que não.

Estas listas, que não são paritárias, mesmo que a Lei da Paridade abane levemente os muros das convenções e do conservadorismo, não são representativas das inúmeras comunidades que formam este país e são, enfim, o mesmo de sempre, com mais uns perlimpimpins: quem lidera são os homens, que são brancos, que se instalam em Lisboa e que olham para o resto do país com uma de duas perspetivas: distanciamento irremediável ou desconhecimento injustificável.

Ainda que as listas tenham mais mulheres do que há uma década, as lideranças são entregues, maioritariamente, aos homens do clube masculino branco influente onde mulheres e não-brancos ficam de fora. É o clube dos cavalheiros extraordinários.

Porque não é a política portuguesa um lugar diverso, integrador e, por isso, mais respeitado pelas/os eleitoras/es? Os motivos parecem ser vários. Entre eles: 1) é um mundo de e para homens brancos com poder de decisão; 2) é o espaço de conflito permanente, onde os homens brancos são entendidos como determinados e fortes e as mulheres – brancas e não-brancas – são percecionadas como estranhas, histéricas ou desenquadradas.

Sim, sabemos que o cenário já foi pior. Contudo, voltemos à “Mulher do cacilheiro”. Nem ela, nem a restante comunidade afrodescendente e não-branca se sentirão representadas na casa da democracia, a Assembleia da República. E se pensarmos nos inúmeros membros da comunidade LGBTQIA+, será que encontram identificação e, por isso, confiança nos parlamentares que andamos a eleger há décadas? Tenho sérias dúvidas. O parlamento português, além de branco e masculino, é publicamente cisnormativo. Se não for, chiu! Não se diz que fica mal (salvo raras e benditas exceções).

Assim sendo, o que podemos fazer para tornar a Assembleia da República mais colorida, mais integradora e paritária?

Com as listas que a generalidade dos partidos apresentou às próximas eleições legislativas, pouco ou nada. Queiramos ou não, elegeremos maioritariamente a branquitude masculina do clube lisboeta. Deixem lá. Assim ninguém nota, fica tudo igual… Um descanso!