Previstas no artigo 178 da Constituição da República Portuguesa, as comissões parlamentares de inquérito são constituídas para cada caso específico, tendo como função vigiar o cumprimento da Constituição e das leis, assim como apreciar os atos do Governo e da Administração.
Por muitos consideradas uma importante ferramenta de controlo, imagem dos poderes de fiscalização do Parlamento, onde são feitos juízos políticos, as comissões parlamentares de inquérito são, a maior parte das vezes, usadas como arma política ao serviço dos partidos que mais não querem do que embaraçar o executivo ou outros partidos que com eles dividem as bancadas da Assembleia da República.
Nos últimos anos, temos assistido nas referidas comissões parlamentares de inquérito a alguns dos mais tristes espetáculos que se possa imaginar. Políticos, banqueiros, altos dirigentes da administração pública, empresários, etc. têm-se sentado perante os deputados que os questionam sobre o papel que desempenharam nalguns dos processos mais escandalosamente célebres da democracia portuguesa.
Quem não se recorda das intervenções de Joe Berardo no âmbito da Comissão de Inquérito à recapitalização e gestão da CGD ou das atuações de Zeinal Bava, Ricardo Salgado e companhia na Comissão de Inquérito à queda do Grupo Espírito Santo.
No quadro da comissão parlamentar de inquérito sobre o Novo Banco, o estranhamente apelidado “Banco Bom” saído do colapso do BES, assistimos, nas últimas semanas, a mais dois tristes espetáculos protagonizados por grandes devedores desta entidade bancária que tanta tinta tem feito correr nos tempos mais recentes.
O “primeiro ator” a comparecer perante os representantes do povo português foi o empresário Bernardo Moniz da Maia, administrador da Sogema, que, em 2014, entrou em incumprimento perante o Novo Banco, com uma dívida superior a 500 milhões de euros. Com vários ataques de amnésia ao longo da sua audição, Moniz da Maia deixou transparecer a ideia que dificilmente poderia ter, ao longo da sua vida profissional, gerido mais do que uma simples loja de conveniência, tal a falta de conhecimentos revelados e a ignorância da realidade de empresas de que supostamente foi ou é o responsável máximo.
Só os mais crentes podem imaginar que partilhou com os deputados e com os seus representados, o povo português, as nuances que levaram a que derretesse um património de milhões, deixando nas mãos dos contribuintes uma enorme conta para estes pagarem.
No início da semana, foi Luís Filipe Vieira, o presidente do Benfica, que apareceu perante os deputados para tentar explicar a razão de ser da enorme dívida da Promovalor, da qual é presidente, ao Novo Banco, fazendo com que esta apareça na lista dos maiores incumpridores. Contrariamente a Bernardo Moniz da Maia, Luís Filipe Vieira apareceu menos amnésico, sendo capaz, no entanto, de sacudir, a cada passo, a água do capote e desresponsabilizando-se das dívidas existentes, assumindo que está e sempre esteve disponível para pagar o que deve e que numa deixou de cumprir as suas responsabilidades.
Confrontado com o facto de, estranhamente, só ser proprietário de um palheiro, nada mais tendo em seu nome, algo que, como é sabido, é sempre conveniente em situações de dívidas de montantes avassaladores, referiu que nem sabia onde era esse palheiro e que deveria ter mais alguns bens em seu nome.
Do funcionamento das comissões de inquérito fica a imagem para o público em geral de que as mesmas representam uma enorme perda de tempo, com um conjunto de pessoas a ensaiar um papel próprio dos bons comediantes, fazendo troça dos representantes do povo português em plena casa da democracia.
O comum dos cidadãos, assistindo a estes tristes espetáculos, protagonizados por algumas pessoas que se habituou a ver, algumas vezes quase diariamente, no pequeno ecrã, fica a saber algo que há muito os mais conhecedores dos meandros da finança já sabem: quem tem uma pequena dívida para com as instituições financeiras tem um grave problema, quem tem uma enorme dívida para com estas faz com que as mesmas tenham um grave problema.
Tristes são aqueles que todos os dias labutam arduamente para levar uma vida digna e cumpridora, respeitando os compromissos assumidos e contribuindo para o desenvolvimento da sociedade portuguesa. Ao seu lado, existem muitos que vivem de recursos alheios, na maior opulência e quando a coisa se complica rapidamente se eximem do pagamento das suas responsabilidades, culpabilizando sempre terceiros pelos problemas que enfrentam.
De uma vez por todas, acabe-se com estes confessionários televisionados ou então consigam extrair-se algumas consequências da passagem destas tenebrosas personagens por uma casa que deveria merecer o respeito de todos os portugueses.