Apresento-vos a Maria. A Maria vive num condomínio que tem painéis solares fotovoltaicos e baterias, destinados ao consumo elétrico de espaços comuns e apartamentos (autoconsumo coletivo). Tem também associado um contrato de energia renovável, para consumo através da rede quando necessário. Através do condomínio, aderiu a um serviço do seu comercializador que permite criar relações virtuais peer to peer para venda de energia excedente nas alturas mais indicadas. A Maria tem um veículo elétrico e o comercializador instalou-lhe um carregador no lugar de garagem. Aproveitou e aderiu a um plano para carregamento do seu veículo em qualquer local. Ao aderir a estes serviços, o comercializador disponibilizou um conjunto de dispositivos inteligentes para a sua casa, como termostatos para regulação automática da temperatura e dispositivos para controlo de iluminação e monitorização da utilização de energia dos seus aparelhos, de forma a otimizar os seus consumos.

Este é o novo perfil de consumidor de energia que assume um papel interventivo e de liderança na transição energética. Este estilo de consumidor, a que chamamos Omnisumer, produz, consome, armazena, gere e transaciona energia. Tem elevadas expectativas e está totalmente envolvido, participa num ecossistema dinâmico de energia através de múltiplos locais, canais e dispositivos e pode desenvolver relações comerciais com diversos fornecedores. É um consumidor verdadeiramente omnipresente. O cliente de energia tem evoluído significativamente ao longo das últimas décadas, inicialmente mais passivo e associado a um ponto de entrega, é atualmente mais informado, envolvido e ativo.

De acordo com um estudo recente da EY1) que envolveu 34.000 consumidores em 17 países e que procurou entender novas necessidades, valores e expectativas de clientes, 92% dos consumidores revelaram ter pelo menos um produto relacionado com energia ou serviço em sua casa, 86% estão interessados em gerar a sua própria energia (autoconsumo), 25% estão a considerar adquirir um veículo elétrico e 13% estão a considerar incluir baterias para armazenamento nas suas casas.

O estudo mostra também que depois dos fatores fiabilidade no acesso a energia e custo, a redução do esforço na adoção de soluções integradas é o maior determinante da satisfação dos clientes em termos de experiência. Esta deve, assim, ser uma das principais prioridades das empresas de energia que enfrentam desafios significativos para adaptar os seus processos, tecnologia e talento por forma a disponibilizar serviços e experiências simplificadas aos clientes. Apenas cerca de 58% dos consumidores inquiridos mostraram satisfação com a facilidade da sua experiência energética ao longo de toda a sua jornada enquanto clientes, sendo que a tendência será vermos os consumidores a esperarem cada vez mais dos seus fornecedores de energia.

Esta década é crucial para o futuro da transição energética. Será um período de forte investimento num futuro verde, de evolução tecnológica e digital, de novos players a aproveitarem oportunidades e de mudanças significativas nas expectativas dos consumidores. A Covid19 veio acelerar estas tendências e as empresas de energia têm uma oportunidade única para transformar o seu modelo de negócio. Irá vencer no mercado quem conseguir desenvolver rapidamente um ecossistema integrado e criar soluções fiáveis e acessíveis para os seus clientes, que se reflitam em experiências simples, sustentáveis e personalizadas. Tal como no setor da tecnologia onde assistimos a um forte crescimento e domínio das empresas focadas no digital e experiência do cliente, chegou o momento do setor energético onde o consumidor tradicionalmente passivo passa a ator principal – Omnisumer.

1) https://www.ey.com/en_gl/power-utilities/how-energy-providers-can-light-the-path