A recente proposta proveniente de um grupo de trabalho ligado a dois partidos que suportam o Governo, mais do que evidenciar uma capitulação à realidade dos factos relacionados com as dinâmicas dos mercados financeiros, trata-se também de um reconhecimento público de que a situação económica e fiscal de Portugal está longe de se encontrar livre de perigo.

No entanto, estas fragilidades da economia nacional não se resolvem colocando grande parte da resposta na União Europeia, sobretudo num pouco provável programa de estímulos específico para Portugal. Recorde-se que o programa de estímulos (ou QE) foi desenhado para estimular a inflação na zona euro, e não para debelar problemas de dívida soberana da periferia. É um facto que este programa permitiu, desde 2015, que os encargos com juros de dívida caíssem drasticamente, uma folga que devia ter sido aproveitada de facto para se aumentar o investimento público, e que poderia ter agora impacto nas taxas de crescimento potencial da economia lusa.

Muito menos se resolvem aumentando o nosso risco no mercado financeiro, ao propor um posicionamento muito tático (diminuindo as maturidades para baixar custos) à equipa de gestão de dívida pública portuguesa, ou drenando liquidez do balanço do Banco de Portugal via redução de provisões ou dividendos. Em caso de eventos inesperados, enfrentaríamos numa situação frágil as necessidades de financiamento, colocando-nos numa linha de tiro, que parece ser invisível. Mas que não é.

Por fim, porque qualquer proposta de reestruturação para Portugal deve vir acompanhada de um compromisso de consolidação orçamental e de reformas que permitam ganhar competitividade e crescer. São estas que representam a chave do sucesso futuro da nossa economia, seja no sentido de reconquistar de forma imediata e definitiva a credibilidade dos parceiros internacionais (sobretudo das agências de rating), seja no sentido de construir um caminho sustentável para a economia. É, por exemplo, visível na moderada mas contínua recuperação do mercado de trabalho em Portugal o impacto das reformas realizadas em 2012, reconhecida aliás pelos relatórios da OCDE neste campo.

Até ao momento, apesar da retórica política,  o Governo conseguiu encontrar apoio à esquerda para implementar cortes duros na saúde, educação ou no investimento e até na criação de impostos para atingir a meta orçamental. Contudo, regressar a uma agenda que permita um ímpeto reformista exige um compromisso mais complexo – afinal, o cimento original desta coligação foi a reversão de reformas e uma ilusão do fim da austeridade. Veremos se entre interesse nacional e político haverá na gerigonça quem se lixe para as eleições.