Assisti àquela reunião da Comissão de Inquisição organizada para o nosso ministro das Finanças e fiquei impressionado. O desgraçado estava com uma cara que parecia um condenado à morte no seu último jantar, e deve ter ficado feliz e suspirado de alívio quando a coisa acabou. Só não soltou o “desta já me safei”, como disse o outro há quinze anos atrás, porque ainda não se safou. Em jeito de conclusão e quanto a se mentiu ou não ao País, ficámos assim: se mais depressa se apanha um mentiroso que um coxo, o homem é um coxo que corre muito devagar. E esta parece ser também a opinião do nosso Presidente, que não disse que acreditava nele, apenas que temos que acreditar nele até se provar que assinou alguma coisa, que é como tirá-lo da frigideira para o deixar cair no lume.
Começando pelo princípio, a primeira coisa que deu para notar é que o homem falava devagar, tão devagar que pareceria que estava com dores e que lhe custava imenso fazê-lo. Deve ser uma espécie de sina nacional, já o ministro (no masculino) anterior era a mesma coisa. Aquilo deve ser um tique que apanham no Banco de Portugal a contar dinheiro, devagarinho para não se enganarem. Esta é, aliás, a primeira coisa que iliba o homem: se tivesse sido ele a discutir as declarações de rendimentos com o Dr. Domingues, ainda estavam hoje no título.
Outra coisa que joga no mesmo sentido é que é impossível perceber-se o que ele diz. Isto, como o próprio admitiu, pode criar confusão. Entre hesitações, meias respostas, e conversa fiada, não fica atrás do oráculo de Delfos. Convenhamos: que tem o Dr. Domingues a ver com o défice orçamental, por exemplo? Claro que assim até parece que estava a fugir à verdade. Estou mesmo a vê-lo ir ao restaurante jantar bacalhau à brás e começar o pedido a elogiar a alheira que tinha comido na véspera e o leitão da semana passada, e depois admirar-se do criado lhe trazer choco frito.
O problema do nosso ministro é que meteram o homem na política, mas não meteram a política no homem. Ninguém lhe explicou o que é a política hoje, que Harold Lasswell definiu como “quem ganha o quê, quando e como”, e que um político é, citando John Bright sobre Gladstone, “um homem que se fez a si próprio e que adora o seu criador”. Um político não mente, apenas conta a sua verdade, e com a convicção de um cruzado. Para ele não há mentira enquanto houver nem que seja 1% de verdade. Veja-se Nixon, a falar de Watergate; Bush, das armas de destruição maciça do Iraque; Clinton, de Mónica. Este caso não tem o alcance de Watergate, não é ele que vai destruir a CGD, nem tem o sex appeal duma estagiária. Os fins justificam os meios, e o ministro só está no princípio. Quanto aos outros, ou queriam um Madoff e foram buscar um padre de província, ou queriam um bode expiatório. Deixem-me abreviar esta história nas palavras de Adlai Stevenson II, numa campanha política em 1952: “tentei chegar a um compromisso com os meus adversários: eles deixavam de contar mentiras sobre mim e eu deixava de dizer a verdade sobre eles.”