A União Europeia regressa ciclicamente ao centro das atenções pelas piores razões. Quando mais se exige, quando a expectativa é elevada, algo surge para baixar os padrões de confiança e credibilidade. Foi assim com a luta contra a pandemia, ao retrocedermos na confiabilidade no projeto e na liderança europeia.

Depois das negociações bem-sucedidas na compra de vacinas e no entendimento da distribuição pelos Estados-membros, o fracasso anunciado do cumprimento do acordo fez recuar tudo o que tinha sido alcançado.

A atitude desafiadora da AstraZeneca em não fornecer atempadamente as vacinas a que contratualmente se obrigou com a Comissão Europeia, lançou sobre esta o anátema da falta de força política. E embora inicialmente tenha ensaiado falar grosso e em tom ameaçador, logo se recolheu sob o manto do politicamente correto, como tem sido apanágio dos políticos europeus. Não é compreensível que as instituições europeias, convictas da sua razão e perante um incumprimento que lesa diretamente os cidadãos europeus, não tenham mantido uma posição firme e irredutível, impedindo a saída do espaço europeu das vacinas produzidas no continente.

Apenas a pressão dos burocratas pode ter forçado as instituições europeias a recuarem na frontalidade da posição inicial e na pobreza da justificação, quando o comportamento da empresa exigia clareza, quando o Reino Unido, beneficiário direto dos fornecimentos, nenhuma consideração mostrou perante a União que voluntariamente abandonou, escolha da qual ainda hoje se vangloria.

A derrapagem na firmeza da posição proporcionou reações sarcásticas das autoridades britânicas e levou os governos de alguns Estados-membros, perante a falta de vacinas e a fragilidade comunitária, a optar pela vacina russa, mesmo sem homologação europeia, o que constituiu mais uma machadada na solidez do processo de decisão europeia.

A descrença instalou-se novamente entre os europeus e ensombra a Europa. O Governo português parece alheado da situação. Tal como a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia parece alheada do que se passa na Europa. Aparentemente, nada de relevante se passa para os cidadãos, pois além do que se discute no silêncio dos gabinetes e nos ecrãs que exibem os quadradinhos dos presentes nas videoconferências, o cidadão está completamente distante do que se possa discutir, matéria eventualmente relevante, mas que os cidadãos ignoram.

A história recente da Europa escreve-se de oportunidades perdidas. Portugal, outrora reconhecido bom aluno, colabora silenciosamente no ‘suficiente menos’, quando podia trabalhar para o ‘bom mais’. Por enquanto, na avaliação preliminar, principalmente na estratégia política europeia do Ministério dos Negócios Estrangeiros, os indícios são medíocres. Mas deve ser do teletrabalho.