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O dia em que os interesses de Pequim, Washington e Moscovo se cruzaram em Sines

Dan Brouillette foi o único dos três últimos enviados de Trump a Portugal que não criticou a Huawei ou o investimento chinês em áreas potencialmente sensíveis como as telecomunicações. Mas deixou avisos sobre os riscos do gás russo dominar a Europa, o que pode ser combatido via porto de Sines.
  • Ministro das Infraestruturas e Habitação (Pedro Nuno Santos) na visita do Secretário da Energia dos EUA a central de Sines
13 Fevereiro 2020, 07h47

O terminal Vasco da Gama no porto de Sines é o novo palco da tensão entre os Estados Unidos e a China. O concurso público para construir e explorar o novo terminal de contentores de Sines foi lançado em outubro de 2019 e dura até junho deste ano.

Um dos mais altos responsáveis do Governo de Donald Trump visitou o porto do litoral alentejano na quarta-feira, 12 de fevereiro, para declarar o interesse de empresas norte-americanas em participar neste concurso público.

“Ha interesse americano aqui. Há interesse americano em investir neste porto em particular, mas também em todo o país e em toda a Europa. Estes investimentos representam a confiança mútua entre os dois países. Parto otimista na relação entre os Estados Unidos e Portugal e as nossas empresas”, disse o secretário da Energia norte-americano durante a sua visita a Sines.

Na comitiva norte-americana encontravam-se várias empresas de construção e gestão de infraestruturas como a Jacobs, a Bechtel, a AECOM e a empresa de gestão portuária Ports America.

Recorde-se que já foi noticiado o interesse de duas empresas chinesas no novo terminal de contentores do porto de Sines: a Cosco e a Shanghai International Port Group (SIPG).

Esta nova infraestrutura em Sines vai implicar um investimento privado de 642 milhões de euros para a sua construção e exploração.

A fita do tempo do novo terminal de Sines tem corrido rapidamente: em outubro, o concurso público foi lançado; em dezembro, o Governo português convidou empresas norte-americanas a participarem no concurso público; em janeiro, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, diz ao Financial Times que “não faz qualquer sentido” o “mito que Portugal é uma espécie de amigo especial da China na Europa”; em fevereiro, Trump envia um dos principais membros da sua administração a Sines, acompanhado por várias empresas norte-americanas.

Huawei não foi tema de conversa entre Lisboa e Washington desta vez

Dan Brouillette foi o único dos três últimos enviados de Trump a Portugal que não atacou a companhia chinesa de telecomunicações Huawei, ou que não lançou críticas ao investimento chinês em áreas potencialmente sensíveis como as telecomunicações.

Antes dele, os alertas foram lançados pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Mike Pompeo, e pelo assessor tecnológico da Casa Branca, Michael Kratsios, nas suas visitas a Lisboa em dezembro e em novembro de 2019, respetivamente.

Os jornalistas questionaram o governante se o potencial investimento da Huawei na rede 5G em Portugal esteve em cima da mesa, o governante deixou bem claro que este tema esteve fora da conversa com o primeiro-ministro António Costa ou com o ministro das Infraestruturas, que tutela as telecomunicações.

“Não discuti isso. Discuti o interesse norte-americano neste concurso público para este porto fantástico e a importancia da independência energetica, não só para Portugal, mas para o resto da Europa”, afirmou o secretário da Energia.

Quando questionado se está preocupado com o investimento chinês em empresas em Portugal, o responsável norte-americano preferiu falar do potencial de negócio para as empresas norte-americanas em Sines. “Não. Nós nunca sugerimos que as pessoas deviam parar de falar com os chineses, não é essa a nossa missão aqui. A nossa missão é deixar que os negócios americanos saibam que estamos interessados neste tipo de infraestruturas. E pode se ver isso pelo interesse demonstrado através da presença hoje de empresas norte-americanas”, declarou em Sines.

Sines faz parte da solução para gás russo não dominar a Europa

Apesar de não ter atacado Pequim, o enviado de Washington defendeu que Sines pode ter uma palavra a dizer para combater o domínio de gás russo na União Europeia.

“A Europa está muito dependente de um fornecedor de energia, a Gazprom [empresa gasista da Rússia]. Onde existe concorrência, a Gazprom baixa os seus preços, o que é bom para os governos da Europa, pois existe diversidade, mas é bom para os consumidores também, obtèm melhores preços. Basta olhar para a Lituania, onde a Gazprom reduziu os preços em quase 30% só com a ameaça de construção de uma infraestrutura para importar gás natural. Onde existe concorrência, a Gazprom baixa os preços, o que é bom para os consumidores.

“Os Estados Unidos tornaram-se um exportador de petróleo e de gás, pensamos que o gás natural liquefeito é um combustível importante para a transição em muitos países europeus, e pensamos que este porto em particular serve como porta de entrada para a Europa, não só para o gás norte-americano, mas para todo o gás que navega no oceano Atlântico”, defendeu.

Dan Brouillette garantiu que vai defender junto da Comissão Europeia a construção deste gasoduto entre Espanha e França que pode potenciar Sines como uma das portas de entrada de gás natural na Europa. Recorde-se que Bruxelas deixou de considerar este projeto como estratégico, logo perdeu o direito a fundos europeus. Ao mesmo tempo, os reguladores de França e Espanha reprovaram o projeto

Já o ministro das Infraestruturas, garantiu que o Governo vai continuar a defender a construção deste gasoduto. “É um processo que está longe de estar terminado. É fundamental para a Europa que consigamos ter um gasoduto a atravessar os Pireneus. Esse é um projeto que consideramos de máxima importância, e continuaremos a lutar para ele possa acontecer”, disse Pedro Nuno Santos em Sines.

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