Não fosse o aumento das taxas de juro da dívida portuguesa, a embrulhada da TSU, o inacreditável número de precários na administração pública, a necessidade de encontrar uma solução para o Novo Banco, a queda substancial do investimento público, a dependência da DBRS e a dificuldade em travar as intenções crescentemente socializantes e populistas da CDU e do Bloco de Esquerda, poderia dizer-se que o Governo se encontra numa maré de sucessos, com as boas notícias a superarem, em muito, as nuvens negras que pairam no horizonte.
Com um dos défices orçamentais mais baixos dos últimos anos, o crescimento económico finalmente a parecer abandonar a letargia que o vinha caracterizando, o desemprego em queda, uma acalmia social que se não via há muito tempo, uma clara sintonia entre o Executivo e o Presidente da República, nada parece travar a caminhada do Partido Socialista, que aparece cada vez mais destacado nas sondagens, com a maioria absoluta mesmo ao virar da esquina.
O sol parece, finalmente, ter chegado a este país à beira mar plantado, levando para longe as nuvens que teimavam em entristecer o povo português, fazendo-o mergulhar num clima depressivo que em nada beneficia quem tenta, afanosamente, pôr a cabeça de fora.
Importa, no entanto, evitar comemorações excessivas, impedir euforias por parte daqueles que pensam que o pior já ficou para trás, sendo fundamental que o PS, na qualidade de cérebro da geringonça, consiga operar o milagre de compatibilizar as exigências contraditórias de uma Europa desejosa de contas públicas sólidas e de dois parceiros que pretendem, apenas, realizar a sua agenda, ainda que tal conduza, num futuro próximo, a nova visita da nossa “bem-amada” troika.
O diabo está à espreita e, na primeira ocasião, aparecerá de novo para tirar as guloseimas que os portugueses já voltaram a degustar. É, pois, essencial que o PS consiga afirmar-se mais europeísta do que socialista, mais prudente do que espalhafatoso, mais conciliador do que beligerante.
Partido charneira no sistema político português, o PS tem, ao longo da sua história, oscilado entre uma versão mais à direita, próxima da social-democracia ou, se se preferir, do socialismo democrático, e um figurino mais à esquerda, chegado à franja mais arejada do PCP. Num momento da história do nosso país, o PS optou por encostar-se à esquerda, mas tentando servir de tampão às veleidades irrealistas que norteiam a atuação de comunistas e bloquistas. Trata-se de uma tarefa homérica, dificilmente concretizável mesmo por alguém com a habilidade de António Costa, capaz de ombrear com o grande Houdini na realização de verdadeiros números de magia.
Não contando com Passos que, decididamente, prefere aliar-se a comunistas e bloquistas a dar a mão a socialistas, resta perceber quanto mais tempo consegue Costa cozinhar em lume brando as pretensões extremistas de CDU e BE, sabendo que, à mais pequena escorregadela, os mercados nos mostrarão novamente um cartão vermelho e nos trarão de volta o diabo de que tanto queremos fugir.