Durante décadas, o diploma foi o bilhete de entrada no mundo do trabalho. Representava um ponto de chegada e garantia, em muitos casos, um emprego estável, respeitado e acima de tudo para a vida. Hoje, essa equação está desfeita, o paradigma alterou-se. A transformação tecnológica, a globalização, a volatilidade económica e a ascensão da inteligência artificial empurraram-nos para uma nova era – a era pós-diploma. Um tempo em que o grau académico já não basta e onde a motivação pessoal se assume como uma das variáveis mais determinantes para a empregabilidade.
Vivemos numa realidade onde o conhecimento técnico se torna obsoleto com uma rapidez inédita. O que se aprende num primeiro ano de um determinado curso pode não estar atualizado no momento da entrada no mercado. Competências como análise de dados, literacia digital, pensamento crítico, criatividade, comunicação ou trabalho colaborativo tornaram-se essenciais, mas continuam, muitas vezes, ausentes dos currículos tradicionais. Pior do que isso: muitos estudantes atravessam o ensino superior sem desenvolver a vontade genuína de continuar a aprender para além dele e este facto pode condicionar o seu futuro.
É aqui que a motivação surge como eixo central da nova equação da empregabilidade. Não como uma qualidade vaga ou opcional, mas como uma competência concreta: o impulso interno para procurar, experimentar, falhar, corrigir e evoluir, ou seja, desenvolver-se. As empresas, cada vez mais, recrutam pelo potencial e pela atitude, e formam internamente para as funções. Procuram pessoas que saibam aprender e acima de tudo que queiram fazê-lo.
Isto não significa, de todo, que o diploma tenha perdido valor. Pelo contrário: continua a ser uma base fundamental de conhecimento, pensamento estruturado e validação académica, ou seja, o passaporte para o mercado de trabalho. No entanto, importa salientar que deixou de ser suficiente. Em vez de um ponto de chegada, como referido, é hoje um ponto de partida. Um trampolim que só cumpre o seu papel se for acompanhado por competências transversais, experiências práticas, sentido de propósito e, acima de tudo, motivação para evoluir.
A questão é que os nossos sistemas de ensino, apesar de algumas reformas, ainda não estão, em muitos casos, habilitados para conseguir responder a esta exigência. Valorizam-se avaliações teóricas e exames cronometrados, mas raramente se ensina a gerir a frustração, a lidar com a incerteza ou a desenvolver projetos a partir de perguntas em aberto. São poucas as ofertas formativas que cultivam esta tipologia de competências e mentalidade e, por outro lado, são muitos os estudantes que se limitam a cumprir um percurso académico sem se sentirem verdadeiramente implicados e motivados para ele.
Num mundo onde o trabalho é cada vez mais feito por equipas distribuídas, em ambientes híbridos, onde é preciso gerir a autonomia, comunicar com eficácia e adaptar-se a contextos de incerteza, a capacidade de automotivação ganha um peso cada vez maior. A motivação torna-se o motor da aprendizagem contínua, da resiliência perante o erro, da procura ativa de soluções.
É urgente que o ensino superior reconheça este novo cenário e se reconfigure, para nele atuar de forma relevante. Isso implica mudanças profundas ao nível dos currículos, das metodologias e da cultura institucional. Os programas de ensino devem integrar competências transversais como parte estruturante do percurso académico. A capacidade de comunicar, liderar, colaborar, pensar criticamente ou resolver problemas complexos tem de ser trabalhada com intencionalidade pedagógica e não vista como um apêndice ao saber técnico.
Paralelamente, a cultura académica precisa de valorizar o erro como fonte de aprendizagem, a experiência individual como tão importante quanto a nota final, e a curiosidade como competência-chave.
A empregabilidade, hoje, não é um destino assegurado por um certificado. É um processo contínuo de alinhamento entre o que o mercado procura e o que cada pessoa tem e quer oferecer. Esse alinhamento só acontece com reflexão, experimentação, redes de contacto e aprendizagem constante. Exige que os estudantes deixem de ser apenas alunos e passem a ver-se como profissionais em construção permanente. Neste novo contexto, as instituições de ensino superior têm de fomentar ambientes que desafiem, inspirem e apoiem.
É impossível prever com exatidão como será o mercado de trabalho dentro de cinco ou dez anos. Mas é possível afirmar, com segurança, que os profissionais mais bem preparados serão aqueles que mantiverem a vontade de aprender, a capacidade de se reinventar e a coragem de agir com ética num mundo em constante mutação.
Para preparar os estudantes para este mercado, as políticas públicas devem apostar num ensino superior mais flexível, centrado no desenvolvimento de competências e na motivação intrínseca dos jovens. Por outro lado, é essencial que os modelos de avaliação dos cursos sejam igualmente repensados. A acreditação e a monitorização da qualidade no ensino superior não podem continuar a basear-se apenas em indicadores quantitativos, como taxas de conclusão, número de publicações ou horas letivas formalmente cumpridas. Avaliar um curso não deve ser uma simples checklist de conformidade, mas sim um exercício crítico que tenha em conta a coerência pedagógica, a eficácia no desenvolvimento de competências e o grau de envolvimento dos estudantes no seu percurso.
Para isso, é necessário introduzir mecanismos de avaliação qualitativa, que valorizem práticas inovadoras de ensino, a articulação entre teoria e prática, e a capacidade dos cursos em promover motivação, autonomia e aprendizagem contínua.
A era pós-diploma não é uma ameaça, é uma oportunidade. Uma oportunidade para reinventar o ensino superior como espaço de transformação, e não apenas de transmissão. Uma oportunidade para formar pessoas curiosas, críticas, comprometidas com o seu percurso e preparadas para realidades que ainda não conhecemos. Precisamos de um ensino que não forme apenas bons executores, mas cidadãos capazes de criar valor, pensar de forma ética e aprender durante toda a vida.