Quando se adicionou o “+” ao que agora se designa usualmente como LGBTQI+ fez-se uma escolha muito feliz. Pode parecer que se incluía assim o sinal de adição para simplesmente prolongar a lógica que somava novas letras à designação. O acrónimo até se estendeu mais – LGBTQIAPN (lesbian, gay, bi, trans, queer, interssexual, assexual, pan, non-binary).

Mais tarde ou mais cedo, haveria que encontrar-se outra metodologia de designação, pois esta tornar-se-ia ilegível e impraticável. Por isso, o “+” resolvia o problema dando por implícita a representação de todas as outras identidades de género referidas por outras letras que ainda pudessem juntar-se a um movimento de reconhecimento cuja identificação, no limite, pode não ter fim. Era isso, e não seria pouco. Uma solução inclusiva que continua e até guarda a história do movimento num lastro de letras vividas.

Mas, na verdade, este “+” pode significar também uma inflexão de estratégia. Feliz não apenas por ser engenhosa, mas por mudar o ponto de vista sobre o próprio compromisso de todos para com a possibilidade de felicidade de cada um. Incluir o “+” liberta o movimento da significação “-” (menos) que vinha necessariamente subentendido com o processo de recorte que cada letra exprime.

Um “-” minoritário, a identificação feita por cada letra identificação de uma minoria, recortada e posta à parte por uma maioria, que, por sua vez, não se conta pelo número de pessoas, mas, na verdade, pelo poder de estatuir e conservar uma normalidade prescritiva, que não raro tende a encarar as pessoas referidas com aquelas letras como desviantes ou mesmo passíveis de diagnóstico patológico.

Cada uma daquelas letras trazia essa ferida que reclamava a justiça do reconhecimento e o direito a ser. Uma história de repressão tão violenta que chega a matar, também em Portugal, onde não podemos de maneira nenhuma esquecer o assassinato de Gisberta. Mas o “+” vem dizer que uma multidão inumerável não é uma multidão de categorias, mas de formas de sentir e viver, na verdade singulares, e que até podem transformar-se ao longo das nossas biografias.

A multidão inumerável não é de identificações mortas, mas de identidades vividas e a viver. O “-” que o “+” dispensa é o da categorização, as caixas cada vez mais ínfimas que nos enfeudam e apartam uns dos outros, como se fôssemos embalagens de plástico.

Neste fim de semana pudemos assistir, na Culturgest, em Lisboa, a “Eu sou o monstro que vos fala”, de Paul B. Preciado, um monólogo com cinco vozes. Muito disto foi dito, mas há um aspecto que gostaria de acrescentar. O seu trabalho intelectual e de vida – no caso, absolutamente indissociáveis – representa uma rebelião ontológica em acto contra as compartimentações que nos matam por falharem o aspecto mais vibrante do viver – transformarmo-nos todos os dias em outra coisa do que fomos.

Preciado chama-lhes jaulas. E isto não diz respeito apenas a minorias, mas a todos nós em tudo o que fazemos.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.