Estamos todos adormecidos pela pandemia e governados por uma esquerda alheada da história e de caminhos recentes da economia portuguesa, como foi o caso paradigmático da crise das dívidas soberanas que conduziu ao célebre plano de ajustamento e à troika.

Estou à vontade para criticar este caminho, pois também sou dos poucos que acho que a direita perdeu a oportunidade de ouro para virar a economia portuguesa na implementação do referido plano. Aumentar brutalmente os impostos, parar todas as obras públicas, deixar falir empresas válidas em lugar de as apoiar (lembro toda a fileira do sector imobiliário e da construção) e deprimir a procura, com um discurso miserabilista serviu apenas para dar lugar à esquerda e, lamentavelmente, à extrema-esquerda, de se alcandorar ao poder.

Dito isto, vem esta prosa a propósito da recente entrevista de António Costa, onde diz três coisas que me deixaram atónito. A primeira é que quer ver em 2021 o retomar da perda do rendimento da função pública; a segunda é que determina o aumento do salário mínimo nacional para 2021; e a terceira, é que também vai deixar cair as empresas que antes da Covid já estavam em situação financeira difícil.

Vejamos cada uma das frases no contexto sócio-económico deste país.

Se pensarmos que quase 20% da população empregada pertence à função pública. Se adicionarmos a estes 20% os cônjuges e o agregado familiar de cada um dos funcionários públicos, os pensionistas, os beneficiários de apoios sociais e os trabalhadores dos sectores regulados e de empresas que vivem, directa ou indirectamente, do sector público e do Estado, rapidamente chegamos a uma percentagem significativa dos eleitores que estarão sensíveis a uma promessa de recuperação do rendimento perdido no período pós-crise da dívida soberana.

Mas a segunda medida é mais escandalosa. Do alto da sua torre de marfim, ao arrepio da maior crise financeira da nossa história, com as empresas a falir em cascata, com o desemprego a subir vertiginosamente, decreta administrativamente que irá aumentar o salário mínimo nacional. Parece a Maria Antonieta a dizer que se o povo não tem pão que coma brioches…

Não estou a ver o sector hoteleiro, aliás, todo o canal horeca, o sector retalhista, o sector do imobiliário e da construção e mesmo as empresas produtoras de bens transaccionáveis que competem com as empresas chinesas, a verem aumentar os custos fixos laborais e a manterem o emprego…

Finalmente, a pérola de quem nunca trabalhou numa empresa privada: não irão salvar as empresas que já tinham dificuldades antes da pandemia.

Apetece perguntar sobre a situação financeira da TAP, ou mesmo sobre a da Efacec ,que justificaram a sua “nacionalização”, mas é indiferente porque ao Governo parece ser preferível pagar fundo de desemprego do que financiar o emprego. Porque será? A resposta está dada no comentário supra à primeira medida: os desempregados são mais dependentes da torneira pública e dos apoios sociais.

Com a dívida pública a rondar os 140% do produto interno bruto, com o desemprego a ultrapassar a fasquia dos 10% (tudo no sector privado), a que haveria de adicionar os desempregados de longa duração, com o sector bancário à bica de um novo tsunami financeiro e as empresas à beira da falência, por falta de uma política séria e realista de apoios, e “last but not the least” com a queda do PIB superior a 12% em 2021 (e estou a ser optimista), temo o pior (mas melhor do que o que temos!): o regresso da troika.

Se compararmos com a recente época da crise das dívidas soberanas e do apoio aos bancos, estamos numa situação muito pior. Com estes péssimos sinais que o Governo dá, o saldo da balança dos bens que mede a relação entre importações/exportações é preocupante, as pessoas não consomem o que é português, as empresas nacionais não conseguem o capital (e não dívida) para financiar a sua sobrevivência e o que parece restar incólume é todo o sector público e os beneficiários dos apoios públicos.

Urge estancar a despesa pública, promover o produto português em detrimento do estrangeiro, diminuindo o saldo da balança de bens, aliviar a carga fiscal e apoiar as empresas portuguesas, com ou sem Covid, através de um sistema objectivo e genérico (fundos de capitais de risco e o banco de fomento) e através da banca, permitindo a esta compensar (com benefícios fiscais) as imparidades com a conversão da dívida em incumprimento em capital social das empresas. Assim se mantém o emprego em lugar do fundo de desemprego.

Em casa que não há pão todos ralham e ninguém tem razão. Não se pode é oferecer brioches.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.