A expressão accountability, de origem inglesa, tem sido amplamente utilizada por terras lusas nos últimos tempos. Sendo um termo cunhado pela Ciência Política é atirado mais ou menos com conhecimento de causa a propósito da responsibilização dos políticos em relação a acções tomadas (ou não) durante o seu mandato. Assim, e relativamente aos tristes acontecimentos que assolaram o nosso país, os fogos, esta palavra trouxe mais conteúdo informativo.
Accountability refere-se à responsabilidade e à responsibilização que um dado indivíduo tem/é obrigado a prestar contas à população quando ocupa um cargo público. Por norma, respeita a políticos eleitos, mas não é exclusivo destes. Também pode, por exemplo, abranger um funcionário público – depende da corrente teórica utilizada para definir o termo.
Em geral, o termo parece ser simples, como é a sua definição, mas a sua aplicação tem que se lhe diga. Senão vejamos: um dado indivíduo, em sede das suas funções públicas, eleito ou nomeado para o efeito, pode ser responsabilizado por actos que não tenham sido os seus? Poder pode, pelo menos politicamente, refiro-me ao nível simbólico, e pode também ser responsabilizado por inacção mas deverá sê-lo? As respostas a estas questões são complexas e tal é visível na diversidade de opiniões que apontam razões para tal na esfera pública. Conforme, aliás, bem foi e é visível nas várias ideias que pulularam nos últimos dias relativamente à demissão ou não da anterior ministra da Administração Interna.
Numa Democracia, a accountability resolve-se (não ao nível criminal) nas eleições seguintes: o eleitor gostou das acções de x, vota no mesmo candidato; não gostou, vota noutro. Mas estas ideias de representação nem sempre parecem singrar. Tal ocorre, na minha opinião, por uma multitude de factores, sendo os mais importantes, para o que me é dado entender, o desconhecimento e/ou descrédito nas ideias clássicas de representação, e, mais ainda, o não tão raro comportamento dos meios de comunicação social – mais concretamente daqueles que agem de uma forma populista e demagógica.
Uma vez mais, há um perigo acrescido nas acções de alguns destes “procuradores da verdade”: passa-se muito rapidamente a fronteira do que é deontologicamente expectável para o que é vendável. Além disso, por detrás da “capa de justiceiros”, alguns meios de comunicação social, que se arrogam ser os únicos a fazer “serviço público”, estão mais preocupados com o seu bem do que com o bem comum, crescendo-lhes hábitos que tanto criticam: a arrogância de não terem quem os controle quando se consideram no direito – talvez bem – de controlarem todos os outros. É, portanto, frágil e ténue esta linha e o Estado está muitas vezes em causa por isso mesmo. Isto não quer dizer que todos os meios de comunicação o fazem, afinal são absolutamente imprescindíveis num Estado democrático.
Governar para a população é importante, mas governar a população nem sempre implica deixar-se seduzir por reivindicações falaciosas, cujos efeitos são simbólicos e pouco práticos. É um erro. A História Universal recente prova-o e há que ter cautelas. Sermos opinantes de Facebook é um direito que nos assiste, mas convém reflectir um pouco mais no que as nossas palavras podem implicar num futuro imediato quando “se pede sangue”. A verdade é que continua a surpreender-me como, no nosso país, para o bem e para o mal – mas mais para o mal – se passa de “besta a bestial” e de “bestial a besta” num trago de café.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.