A tragédia humana em Gaza continua a envergonhar todas as nações civilizadas que fecham os olhos perante os crimes cometidos contra milhares de civis indefesos. É difícil estimar o número exato de vítimas mortais, quando a única fonte disponível é um ministério da Saúde controlado por um grupo terrorista. No entanto, provavelmente o número avançado por esta entidade do Hamas, de cerca de 40 mil mortos (na sua maioria mulheres e crianças), não andará muito longe da verdade.

Israel tem direito a existir e a defender-se, mas enquanto potência ocupante tem igualmente a obrigação de defender as vidas e os bens dos civis palestinianos. Não é aceitável lançar mísseis sobre edifícios residenciais, escolas, mesquitas e igrejas, mesmo que o Hamas tenha de facto combatentes seus nesses locais.

Não é aceitável encaminhar a população civil para determinadas zonas da Faixa de Gaza e, poucas horas depois, bombardear esses mesmos locais. Imagine, caro leitor, o desespero de um pai e uma mãe que tentam salvar os seus filhos nestas circunstâncias. Se Israel pretende fazer com que os seus vizinhos mais próximos o odeiem durante as próximas gerações, diria que está a ser tremendamente bem-sucedido.

Tal como afirmou por estes dias o chanceler alemão, Netanyahu tem agora a oportunidade de quebrar o “ciclo da retaliação”, permitindo um cessar-fogo e impedindo o escalar do conflito com o Irão. Porém, o primeiro-ministro israelita já demonstrou que está mais interessado em incendiar o Médio Oriente (e o mundo) do que em concluir rapidamente a intervenção em Gaza e libertar os 111 reféns que ainda estão nas mãos do grupo terrorista.

Veremos se, com o provável regresso de Donald Trump à Casa Branca, Benjamin Netanyahu terá a mesma margem de manobra, tendo em conta as posições que o candidato republicano tem tomado sobre o conflito, criticando a forma como Israel está a travar a guerra em Gaza. A eventual vitória de Trump nas eleições de novembro não será, provavelmente, uma boa notícia para Netanyahu, ao contrário do que se possa pensar à primeira vista.

Por um lado, Trump é isolacionista e tem com os aliados dos EUA uma relação mais utilitária, quando comparado com Biden. Para o candidato republicano, os EUA devem apoiar Israel enquanto isso for ao encontro dos interesses norte-americanos. Para Trump, conter a influência do Irão e dos seus aliados no Médio Oriente será do interesse dos EUA. Porém, começar a Terceira Guerra Mundial talvez não o seja. Enquanto Biden fez saber que os EUA estariam sempre do lado de Israel, Trump é isolacionista e errático no que diz respeito às relações com os aliados, tanto no que diz respeito aos do Médio Oriente como aos da Europa e da Ásia.

Por outro lado, Trump ambiciona ficar para a História como o presidente que alcançou a paz no Médio Oriente. No seu primeiro mandato, promoveu os chamados Acordos de Abraão, que abriram a porta à normalização das relações entre Israel e vários países sunitas, que temem mais o Irão xiita do que o estado hebraico.

Se, por um lado, Trump reconheceu Jerusalém como capital de Israel, por outro distribuiu fundos e outras benesses por países como Marrocos, os Emirados e o Sudão, em troca do seu reconhecimento do Estado de Israel. Esse processo está agora em risco, após o brutal ataque do Hamas em 2023, com apoio iraniano, que teve como objetivo impedir esta normalização e incendiar a região. A resposta de Israel fez o resto.

A dança do radicalismo e da guerra “custe o que custar” só resulta se for bailada a dois. E os extremistas dos dois lados alimentam-se mutuamente.

Esta coluna vai de férias. A todos os leitores, muito obrigado pela confiança e até breve.