Bastou um ano para João Lourenço conquistar a presidência de Angola e a liderança do MPLA, mas o grande feito consistiu na razia que executou nos cargos de topo e culminou em mais de 200 exonerações e várias detenções, a mais importante delas a do ex-ministro dos Transportes, Augusto Tomás, dando um sinal claro de que os tempos iriam mudar.
Antigo general e descrito como austero e reservado, José Lourenço tem gerido com mão forte o país e iniciou a sua acção governativa pela área da economia, para além do combate feroz à corrupção, com medidas que favorecem a iniciativa privada onde defende a privatização da companhia aérea estatal TAAG, a quebra da dependência do petróleo, o aumento da produção de bens alimentares e a diminuição das importações, entre outras medidas, para regularizar o Fundo Soberano de Angola.
Com estas acções conquistou o apoio popular. Mas foi a prisão preventiva de José Filomeno, filho de José Eduardo dos Santos, por indícios de crimes na gestão do Fundo Soberano de Angola, que fez a opinião pública render-se. A surpresa foi de tal ordem que muitos compareceram na Prisão de São Paulo, instalada no bairro de Rangel, um dos maiores musseques de Luanda, para comprovar aquilo que parecia um milagre: a prisão de um dos membros da família mais poderosa e até agora intocável no país. Abanou a opinião pública e a elite, parte dela optou por sair do país ou evita entrar –caso de Isabel dos Santos, que não é vista em Angola há várias semanas.
Tudo isto é surpreendente, ainda mais por assentar tudo na vontade de um só homem. O que poderá ser perigoso também. Terão as instituições democráticas poder suficiente para fazer prevalecer e manter as novas directivas de actuação, ou continuarão fragilizadas? O futuro o dirá e à velocidade com que Angola está a mudar não será preciso esperar muito.
E qual a posição de Portugal face a esta mudança política e económica? Depois de uma visita recente do nosso primeiro-ministro a Angola, e prevista uma visita de João Lourenço a Portugal em Novembro, aparentemente as relações entre os dois países estabilizaram, deixando para trás o “irritante” processo judicial que envolveu Manuel Vicente e causou tensão entre os dois países.
Oficialmente, a visita serviu o propósito de firmar acordos de parceria em prol da recuperação económica, veremos se da recuperação exclusivamente da economia angolana ou da nossa, se persistirmos em velhos erros de gestão, como o acordo para evitar a dupla tributação, o aumento das linhas de crédito para exportações e as colaborações no sector agrícola.
Angola serviu de escape para muitos portugueses e empresas durante o período mais negro da crise económica, muitas seduzidas pelo brilho de dinheiro fácil e a impunidade em negócios obscuros. Estarão preparados para voltar e actuar nesta nova Angola?
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.