Catarina Matos
Director EY, Tax Services
A taxa reduzida de IVA de 6% vai aplicar-se apenas a empreitadas de reabilitação de edifícios. Como avalia as alterações introduzidas?
O IVA nas obras de reabilitação urbana, principalmente quando estejam em causa projetos de construção nova, é um tema que tem gerado muita polémica junto de várias instituições, designadamente Câmaras Municipais, Autoridade Tributária (AT) e tribunais portugueses, tendo o Governo aproveitado o Programa Mais Habitação para propor alterações na matéria.
Por um lado, a taxa reduzida passa a aplicar-se à reabilitação de edifícios e não já de imóveis, com a consequência imediata de excluir da mesma projetos de construção nova, isto é, em terrenos (que qualificam como imóveis mas não como edifícios). Parece-nos de lamentar esta alteração, principalmente num momento em que os próprios tribunais têm vindo a admitir a aplicação da taxa reduzida de IVA a empreitadas de construção.
Por outro, altera-se o tipo de intervenções abrangido, que passa a compreender “empreitadas de reabilitação de edifícios”, enquanto a redação atualmente em vigor abrange “empreitadas de reabilitação urbana”, introduzindo-se um conceito vago e amplo de reabilitação, que permitirá uma (ainda) maior discricionariedade à AT na interpretação da norma e trará certamente uma vaga de litigância entre a administração e os contribuintes.
Num pacote em que o aumento da oferta habitacional é uma prioridade, a norma agora proposta surge como um claro desincentivo ao investimento e à promoção imobiliária, o que irá certamente refletir-se na colocação de novas casas no mercado e nos preços do segmento residencial.
Baixar a taxa do IVA de forma generalizada na construção de habitações, atualmente limitada às habitações sociais, cooperantes e de reabilitação, podia ser uma via a explorar?
Esta poderia sem dúvida ser uma via a explorar. Em Portugal, o IVA assume um peso significativo nos investimentos imobiliários, onerando, em regra, em 23 p.p. o valor geral da empreitada que, no caso de imóveis habitacionais, será um custo final do promotor, que o repercute no comprador dos imóveis construídos, através do respetivo preço. Veja-se o exemplo espanhol, em que a aquisição de serviços de construção civil para fins habitacionais está sujeita à taxa reduzida de IVA de 10%. Assim, uma redução em 17 p.p. dos custos da promoção imobiliária poderia vir a ter um impacto decisivo em dois fatores determinantes para o bom desempenho do setor imobiliário: a margem do investidor e o custo final dos imóveis habitacionais, ambos potencialmente concorrendo para uma estabilização dos preços no segmento habitacional.
Cristiana Santos
Manager da EY, Tax Services
A nova contribuição no Alojamento Local (AL) pode levar à fuga para o mercado paralelo com as casas nas zonas de veraneio a deixarem de estar no mercado, deixando de estar reguladas? Concorda com as dúvidas quanto à sua potencial ilegalidade e inconstitucionalidade?
A introdução de uma contribuição nova, extraordinária e sem contrapartida palpável para o seu pagador constitui sempre uma dialética difícil de dirimir, na medida em que pretende levar ao desincentivo da colocação de novas casas (ou mesmo de manutenção das atuais) no mercado do AL, sendo, no entanto, igualmente expectável que possa levar também à fraude e evasão fiscal. Foi precisamente a necessidade de combate à fraude e evasão fiscal que motivou a criação do regime jurídico e fiscal da atividade do AL, cuja revisão agora proposta incentivará diversos agentes a enveredar por situações de exploração de imóveis não declaradas e à margem da regulamentação aplicável, com especial prejuízo para o setor turístico e para o erário público. Esta contribuição vem colocar obstáculos ao desenvolvimento de uma atividade que tem dado um enorme contributo ao sector do turismo, à economia em geral e promoveu ao longo dos últimos anos a reabilitação de um conjunto significativo de imóveis. É incerto o impacto que a reforma agora proposta surta o efeito desejado, isto é, o aumento da oferta de imóveis para venda ou arrendamento.
Como avalia a diminuição da tributação em IRS para os senhorios?
A redução da taxa autónoma de IRS sobre as rendas decorrentes de contratos de arrendamento habitacional, dos atuais 28% para 25%, bem como a redução mais expressiva para contratos de longa duração ou a isenção de rendas resultantes do arrendamento de imóveis antes explorados em AL são, naturalmente, medidas de aplaudir, mas que, no entanto, não nos parece que venha a ter um impacto significativo no objetivo de aumento do número de fogos no mercado de arrendamento habitacional, considerando a desconfiança relativamente generalizada quanto ao mercado de arrendamento e aos mecanismos de proteção dos senhorios, bem como aos entraves ao aumento de rendas.
A isenção de IMT na compra para revenda passa de três para um ano. Qual é o impacto desta medida no sector?
Estamos em crer que o prazo de um ano pode ser manifestamente insuficiente para levar a cabo obras de remodelação ou melhoria, ainda que de pequena dimensão, que os imóveis comprados para revenda necessitam, o que significará a oneração da atividade de compra para revenda com o IMT e o que em nada beneficiará a tão pretendida descida dos preços dos imóveis.
Bruna Melo
Partner da EY, Tax Services
A partir de 2023, para a isenção de mais-valias, o imóvel vendido terá de corresponder à morada da família, nos dois anos anteriores à venda, com o respetivo domicílio fiscal declarado nas Finanças. Está também previsto que o contribuinte só seja dispensado deste tipo de pagamento, se não tiver tido um benefício semelhante no ano dos ganhos, e nos três anos anteriores. Passará a não ser possível mudar de casa muitas vezes, escapando às mais-valias?
Estas medidas pretendem impor determinados entraves à utilização abusiva desta exclusão de tributação, que se tinha vindo a verificar nos últimos anos, designadamente com o alternar do domicílio fiscal entre primeira habitação e habitações secundárias, com o intuito de realização de mais-valias sucessivas excluídas de tributação ao abrigo deste regime. No entanto, parece-nos que os limites agora impostos são demasiado severos, dificultam em grande medida a mobilidade social, onerando injustificadamente, a nosso ver, os contribuintes que, por necessidade ou opção, mudam de residência com maior frequência. Um tiro ao alvo da especulação imobiliária, é certo, mas que atinge colateralmente situações legítimas de mudança de habitação.