O dia das eleições está aí.

Para aqueles que votam em função das suas convicções ideológicas, a escolha é relativamente simples. Votam no partido que corresponde à sua primeira preferência e esperam que ele tenha o maior número de votos possível.

A opção pode revelar-se problemática, contudo, para aqueles que fazem questão de que o seu voto contribua efetivamente para alcançar um objetivo mais preciso, seja ele escolher o primeiro-ministro, atingir ou evitar uma maioria absoluta, reforçar a representação parlamentar de um dado partido, ou eleger pela primeira vez um certo deputado. Votar útil, neste sentido amplo da expressão, pode revelar-se um autêntico labirinto.

Nunca ouviremos Catarina Martins dizer “para evitar a maioria absoluta do PS, vota PSD!”, embora possa ser de facto essa a melhor estratégia para, em vários dos círculos eleitorais, alcançar o objetivo primordial do BE. Seria pedir demais aos bloquistas, certamente, mas, em todos os círculos em que o respetivo partido não tem hipóteses de eleger um deputado – e são bastantes –, só o voto no PSD (ou até no PCP) pode ajudar a evitar a maioria absoluta do PS.

Para votar útil, os cidadãos precisam de cruzar pelos menos quatro tipos de informações, de diferente complexidade: 1) quantos deputados elege o seu círculo eleitoral; 2) qual é a percentagem de votos que, nesse círculo, (permite ou) garante a eleição de um deputado; 3) quais as tendências reveladas pelas várias sondagens realizadas; 4) e, finalmente, como se fez a repartição de mandatos entre os diferentes partidos, nesse círculo, nas eleições anteriores. É matéria para consumir todo o dia de reflexão.

Quanto à dimensão das circunscrições, o problema está na grande disparidade existente entre os círculos maiores – Lisboa com 48, Porto com 40, Braga com 19 e Setúbal com 18 – e os mais pequenos – Portalegre com apenas dois, Bragança, Guarda, Évora e Beja com três cada, Castelo Branco com quatro. Daqui se depreende, desde logo, que os partidos mais pequenos têm poucas hipóteses reais de eleger nos círculos mais reduzidos e votar neles, aí, é deitar votos ao lixo.

Isso mesmo é confirmado pela conjugação da dimensão de cada um dos círculos com o número de partidos concorrentes, de onde se extrai o limiar (em percentagem) a partir do qual está garantida a eleição de um deputado. Se os lisboetas podem votar praticamente em quem quiserem – 2% dos votos asseguram a eleição de um deputado –, os portalegrenses devem ter consciência de que só 33% dos votos afiançam a eleição de um parlamentar. Ainda que esse limiar baixe nos vários distritos que elegem três deputados cada, não deixa de rondar os 25%.

É claro que, se os votos se dispersarem muito pelos diferentes partidos, em termos equitativos, será possível eleger um deputado com percentagens inferiores, mas é um risco grande que os eleitores correm. Sobretudo, nos círculos verdadeiramente pequenos, só quase por milagre se consegue eleger um deputado com votações abaixo de 10%. O regime eleitoral português, neste ponto, comporta-se pior do que os sistemas que compreendem a existência das tão vilipendiadas cláusulas-barreira.

Assim, se um eleitor está a pensar votar num pequeno partido ou, o que vai dar ao mesmo, num partido novo, mas vive fora de Lisboa, Porto, Braga, Setúbal ou Aveiro, o melhor é tirar daí o sentido. Vai desperdiçar o seu voto.

Depois, o eleitor que faz questão de votar útil tem de olhar com cuidado para as sondagens – e não fazer de conta, como os políticos, que elas não servem para nada. A generalidade das sondagens, porém, apresenta projeções globais, a nível nacional, sem as desagregar por círculos. Por isso, elas ajudam pouco os eleitores que vivem fora dos círculos maiores ou em círculos muito marcados politicamente, como Viseu ou Beja, cujas votações por regra se desviam muito dos totais nacionais.

Por fim, é fundamental cruzar as sondagens relativas às eleições em curso com os resultados de anos anteriores – disponíveis nos sites da CNE ou do MAI –, para ver, em cada círculo, como se tem feito a distribuição dos deputados. Frequentemente, é difícil remar contra a maré: há círculos cor de rosa, círculos cor de laranja e alguns círculos avermelhados e pouco se poderá fazer para mudar.

Enquanto não existir uma app que ajude os cidadãos a fazer estas simulações todas, importaria apostar no reforço da literacia eleitoral. Votar útil será sempre uma decisão de risco, mas, pelo menos, há determinados erros de palmatória que se podem evitar. Um deles, como se viu, é votar em partidos pequenos nos círculos pequenos. Outro é votar em partidos pequenos em círculos grandes, quando apenas se pretende garantir a eleição do cabeça de lista. Muito provavelmente, como esse já tem a eleição garantida, os votos adicionais apenas contribuem para eleger os candidatos anónimos que figuram no segundo ou no terceiro lugar da lista.

Boa sorte, portanto, para todos os adeptos do voto útil.