Nos tempos em que ainda tínhamos o hábito de comprar discos, estávamos familiarizados com os famosos lado A e lado B. Fazendo a analogia com o panorama fiscal, num disco cujo nome seria “Tendências atuais da fiscalidade”, teríamos no lado A os êxitos ATAD, BEPS, DAC6. No lado B, músicas como ESG, GRI, ODS. Permitam-me explicar.

Os lados A são sempre mais tocados. Neste caso, a música passa por prevenir a evasão, assegurar que não há fuga de capitais para jurisdições de baixa ou nula tributação e através de mecanismos de troca de informação entre administrações fiscais, evitar situações que possam ser consideradas abusivas. Novas regulamentações, limites e obrigações de reporte.

No lado B, a música é outra. O ponto de partida não é tão eminentemente técnico, mas ligado à prossecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas e ao papel que as empresas, enquanto cidadãos corporativos e motores de desenvolvimento económico, têm a desempenhar. Os pilares são os ODS e o papel que os impostos pagos pelos cidadãos corporativos têm em contribuir para a sua concretização.

O foco é, portanto, a transparência quanto à estratégia fiscal adotada pelos cidadãos corporativos. Ao medir os impactos que uma empresa tem em matéria ambiental, social e de governo societário (environmental, social and governance – ESG), a questão fiscal é mais um dos temas sociais cujo impacto deve ser medido. Até agora, a questão fiscal tem sido “tocada” no lado B precisamente por um grupo de empresas que se distinguem pelas práticas de sustentabilidade – B Corps (como a Patagonia) ou B Team (movimento criado por Sir Richard Branson e Paul Polman, ex-CEO da Unilever, entre outros nomes de relevo).

Os critérios de medição de impacto a que as empresas vão começando a estar sujeitas apontam cada vez mais nesta direção – mais do que apontam, empurram (o intraduzível nudge). Desde Larry Fink, CEO da BlackRock, incentivando os seus CEO nas cartas anuais desde 2018 a procurar investimentos responsáveis e que tenham em consideração critérios ESG, nomeadamente os adotados pela Global Reporting Initiative (GRI), à aprovação pela União Europeia do Regulamento Taxonomia em 2020, sobre a adoção de princípios de finanças sustentáveis. Follow the money.

A partir de janeiro de 2021, para empresas que adotam o padrão GRI para reporte ESG e tenham identificado a área fiscal como vital, é obrigatória a inclusão de informação fiscal nos termos do modelo GRI sobre fiscalidade. Os respeitáveis IFRS e as demais normas contabilísticas são presumivelmente a próxima paragem para reporte deste tipo de informação, conforme já se indicou em dezembro passado. Por cá, neste início de fevereiro, a CMVM publicou um modelo relativo a reporte ESG, incluindo matérias de estratégia fiscal.

As perguntas que ficam são: ao dançar ao som do lado B, consigo dançar também ao som do lado A? Devo focar-me somente na regulação do lado A ou devo procurar um outro grau de análise da minha estratégia fiscal, virando o disco? A resposta é diferente? Melhor, se testar a minha estratégia fiscal de acordo com a música do lado B, terei sempre sucesso nos testes do lado A?

Acredito que sim, e que as empresas que dançam também o lado B ganham uma vantagem competitiva – no financiamento, no capital de confiança com clientes, na retenção de talento, na capacidade de influência.

Afinal de contas, o que seria de nós sem ouvir o “We will rock you” dos Queen, um famoso lado B?