Numa altura de incerteza, os momentos de crise apresentam-se como oportunidades para reflexão. O vírus que nos obriga a ficar em casa já está a desafiar a forma como nos relacionamos, como consumimos e o espaço que a Saúde ocupa nas nossas vidas. Há pouco mais de um mês a Saúde talvez não estivesse no topo das nossas preocupações, muitas vezes abafada pelas tarefas do dia, os compromissos sociais ou os deveres financeiros. Num tempo não muito distante, uma questão de Saúde gerava empatia entre pessoas pouco próximas ou desconhecidos, mas apenas verdadeira e real preocupação quando atingia o próprio ou a família e amigos chegados.

 

Hoje, o escalar de um problema da esfera individual para a esfera pública, remete-nos ao isolamento, na tentativa de conter e atrasar a propagação de um vírus, tentando reduzir o número de casos ativos em cada momento, e mantendo a capacidade de resposta nos serviços de saúde.

 

O isolamento que praticamos não é apenas por nós próprios, mas também por aqueles que não conhecemos e que podem estar mais vulneráveis ou fragilizados. As nossas escolhas de distanciamento social na tentativa de “achatar a curva” da propagação da infeção, procuram evitar que o nosso Sistema Nacional de Saúde seja sobrecarregado, garantindo a todos uma oportunidade de tratamento com os recursos necessários.

 

A verdade é que a transformação digital que já se realizou no SNS tem vindo a apoiar a resposta a esta crise, sendo bem conhecidos os exemplos de prescrição eletrónica, a linha SNS24 e até a nova ferramenta online “Avaliar Sintomas” que pretende dissipar as dúvidas em relação à COVID-19 e aliviar a linha telefónica.

 

Contudo, as dificuldades operacionais que observamos também nos obrigam a perguntar, será que esta transformação digital está a ser realizada a um ritmo útil? Por que razão não conseguimos mobilizar a resposta digital de outros países para identificar indivíduos de alto risco, praticar telemedicina, aconselhar e acompanhar o doente remotamente? Estamos a aproveitar plenamente as ferramentas digitais que possuímos para aliviar os profissionais de saúde e maximizar o foco no doente?

 

A situação de emergência que vivemos reforça a necessidade de repensar não só a Saúde, mas também a economia e como fundamentalmente esta depende de servimos e geramos valor uns para os outros, de pessoa para pessoa. A ausência do fornecedor, do prestador de serviços ou do consumidor obriga a questionar, temos dado a verdadeira importância à Saúde?

 

Esta tem assegurado um lugar da maior relevância pela sua importância do ponto de vista humanístico, mas será que deveria ser também priorizada como força motriz para a continuidade do negócio, da economia e da vida em sociedade? A crise que juntos ultrapassaremos irá despertar a era digital como nunca anteriormente, não só para agilizar a Saúde e criar maior resiliência operacional para crises futuras, mas também para nos libertar do que não é essencial, permitindo finalmente humanizar a economia?