A narcose coletiva em que o país mergulhou desde as eleições legislativas, tem distraído os economistas de dissecarem a forte recessão que assola a Alemanha e suas consequências em Portugal e na zona euro.

As últimas projeções do Banco Central Europeu (BCE) para 2024 indicam um crescimento da zona euro de 0,6%. Neste, é incontornável o peso da Alemanha – uma quebra na atividade económica de 0,3% no último trimestre de 2023 alinha-se com uma estimativa de crescimento de 0,0% para a zona euro no mesmo período.

Dois antigos conselheiros económicos do Governo alemão, Tom Krebs e Isabella Weber, redigiram um relatório onde defendem que a invasão russa da Ucrânia redundou no maior colapso do nível de vida alemão desde a Segunda Guerra Mundial, com uma queda do PIB comparável à da crise financeira.

Weber, recorde-se, ficou conhecida por sugerir a introdução de controlos estratégicos de preços como um instrumento de emergência para lutar contra a inflação. A receita europeia, no entanto, foi a subida das taxas de juro.

A somar-se à crise energética e à inflação, em novembro passado foi espoletada uma crise de finanças públicas, liderada pelo Tribunal Constitucional (TC). A história remonta a 2009 quando, em resposta à crise financeira, o governo alemão adotou regras nacionais, mais restritivas do que as da União Europeia, para refrear o endividamento público. A suspensão destas regras foi possível durante a crise pandémica, criando-se até um fundo de emergência nacional.

Invocando estas regras, em novembro o TC não permitiu que o governo alemão usasse os 60 mil milhões de euros que sobraram deste fundo. Note-se que o objetivo seria investir em infraestruturas para promover a transição climática e o aumento da eficiência energética. No entendimento do TC, a dependência energética e uma crise económica profunda não serão exceção suficiente para transpor os limites do endividamento público.

A visão alemã não está circunscrita às suas fronteiras. Por cá, introduzir limites ao défice e à dívida, inscrevendo-os até na Constituição, tem tido os seus adeptos. Uma primeira versão surgiu durante a governação de Passos Coelho e levou mesmo a então presidente do Conselho de Finanças Públicas a manifestar-se contra. Há cerca de um ano, a ideia regressou à Assembleia da República, sob proposta da IL e do PSD, tendo sido rejeitada pela maioria.

Hoje, a Alemanha é cobaia das suas próprias experiências, com resultados desoladores dentro e fora de fronteiras. Esperemos que estes ensaios frustrados afastem os candidatos a ratinhos.