O mercado do controlo de empresas societárias vai aquecer em Portugal. E porventura em sentido inverso ao do imobiliário, ao contrário do que os agentes deste mercado tanto veiculam, convictos que por o afirmarem muitas vezes tal realidade se concretizará.
Dito isto por um advogado de M&A poderia parecer presunção, mas há dados e evidências que explicam o fenómeno que irá caracterizar o dinamismo deste mercado onde se negoceiam empresas.
Há excesso de liquidez nos fundos de private equity e em alguns operadores estratégicos, que estão a estudar as oportunidades e a prepararem-se para ir às compras, com activos baratos, com EBITDA históricos (2020 e 2021) inferiores ao que seria normal e com constrangimentos de tesouraria (e mais difícil acesso ao crédito bancário) que os obriga a ir buscar ao mercado soluções alternativas.
Uma dessas soluções seria o recurso à alternativa ao tradicional crédito bancário denominado “private debt” (dívida subordinada, “quasi-equity” ou “mezanine debt”) . Dívida mais cara que a dívida bancária, mas, em muitos casos, mais eficiente que o custo de capital próprio. O reverso desta medalha são as estratégias de “loan to own” (tomar o controlo pela conversão da dívida em capital) que muitos desses credores perspectivam, voluntariamente ou por força do incumprimento dos devedores.
Ora, o empresário português é avesso a este tipo de investimento na sua empresa, quer pelo custo, que compara com o do crédito bancário, quer pela possibilidade de conversão dessa dívida em equity, com a consequente perda de controlo, total ou parcial da sua empresa.
A verdadeira alternativa é colocar no mercado as empresas societárias. Ora, com os métodos de avaliação comumente praticados (cash flows descontados, múltiplos de EBITDA, descontada a dívida financeira líquida), com insolvências eminentes (distressed M&A) ou problemas de gestão relacionados com os constrangimentos de tesouraria e deficit de capitais próprios, os activos são baratos!
A somar a estas evidências, que caracterizam muito do midle market (as PME) português, temos uma banca, sobretudo espanhola, a apoiar financeiramente os planos de crescimento inorgânico das empresas espanholas, há muitos anos o principal player do mercado de M&A em Portugal.
Claro que todos os actores deste mercado sabem que a maior parte das PME não têm os requisitos mínimos para entrarem nos radares dos grandes players – fundos de private equity internacionais. Não têm os tickets mínimos para serem interessantes numa lógica de rentabilidade (por exemplo, um EBITDA de 10M€ é raro em Portugal).
Tantas vezes, aqueles operados confidenciam que investir 50M€ ou 500M€ num target não é indiferente, numa lógica da mesma afectação de recursos para um multiplicador de duas vezes o investimento num horizonte temporal de cinco anos. Por isso, o mercado espanhol de M&A tem uma vivacidade muito superior ao nosso. Não obstante, esses players estão aí a competir (ou em consórcios) com os nosso fundos de private equity na selecção das melhores oportunidades.
Já as poucas grandes empresas portuguesas são targets apetecíveis para aqueles fundos e vamos assistir a transacções de M&A nas transacções, na banca e no sector da energia renovável, incluindo o regressar das Ofertas Públicas de Aquisição, amigáveis e hostis.
O mercado de “distressed M&A” também vai ressurgir da crise. Os fundos abutres vão querer aproveitar e adquirir aquelas empresas em situação financeira difícil, mas com viabilidade económica. Ou então vão adoptar estratégias de “asset stripping”, liquidando as empresas e vendendo partes das mesmas. O todo não vale mais do que a soma das partes…
Os bancos vão ter de colocar no mercado os novos non performing loans, os quais, por seu turno, darão lugar a estratégias de “loan to own”, amigáveis ou hostis.
Dito isto, termino como comecei. O mercado a apostar na retoma é seguramente o do M&A e private equity, com os activos a desconto e numa lógica de buyer market! É o comprador que ditará as regras, haverá menos processos competitivos de venda de empresas e mais negociações face a face, onde o comprador ditará as regras, as declarações e garantias e o preço justo.
O imobiliário, com o ataque aos golden visa, com a sempre anunciada reforma fiscal sobre o património e sucessões, com a oferta a aumentar exponencialmente, com os problemas que se avizinham na banca e o aumento das taxas de juro anunciadas e com o regresso ainda tímido do investidor estrangeiro, temo que as transacções diminuam e consequentemente o preço dos activos seja ajustado em baixa.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.