O mercado imobiliário em Portugal tem sido, nos últimos anos, uma das áreas de maior dinamismo económico. A par de uma procura crescente, impulsionada tanto pelo interesse de investidores estrangeiros e nacionais como pela necessidade de habitação própria por parte dos residentes, o setor tem atravessado mudanças significativas, sobretudo no plano jurídico e regulatório. Em 2024, o foco recaiu sobre a contenção da valorização não sustentada, o estímulo ao arrendamento de longa duração e o reforço da sustentabilidade na construção. Já em 2025, a atenção vira-se decisivamente para o quadro da imigração e nacionalidade, cujas alterações recentes terão impactos diretos, e pouco debatidos, sobre a indústria imobiliária.
Alterações dos Vistos Gold e as consequências reais
As alterações ao programa dos Vistos Gold iniciadas em 2023 tiveram, em 2024, o seu ponto de viragem, com o fim definitivo dos investimentos imobiliários como via de elegibilidade. Contudo, a obtenção deste visto continua válida através do investimento em fundos específicos. Ainda assim, o seu peso simbólico e o impacto em certos segmentos, sobretudo no segmento de luxo em Lisboa, Cascais e Algarve, eram inegáveis. Agora, com os novos critérios de naturalização mais exigentes, abaixo descritos, até os que procuram residência via investimento em fundos alternativos enfrentam uma trajetória mais longa e incerta para a cidadania. Aos olhos dos investidores, a atratividade do país enquanto destino estratégico de investimento de longo prazo fica, portanto, sob forte interrogação.
Novas limitações ao Alojamento Local: um recuo tático?
As restrições ao Alojamento Local (AL), já duras em 2024, tornam-se ainda mais relevantes no contexto de 2025. O registo de novos AL em zonas de forte procura foi praticamente congelado, com impactos diretos na oferta para turistas e, indiretamente, nos modelos de negócio das plataformas tecnológicas como Airbnb e Booking. Mas será esta medida suficiente? O mercado respondeu com modelos híbridos de arrendamento de média duração, como os promovidos por PropTechs orientadas para nómadas digitais ou expatriados, que se escapam ao regime tradicional de AL, mantendo rendimentos elevados para proprietários. Mais do que regular, o Estado poderá estar a empurrar a informalidade para novas formas jurídicas pouco vigiadas.
Incentivos ao Arrendamento de Longa Duração: entre boa vontade e burocracia
Os incentivos fiscais introduzidos para estimular o arrendamento habitacional de longa duração mantêm-se em 2025. Contudo, os efeitos continuam limitados. Muitos proprietários mostram-se reticentes, face à instabilidade legislativa, morosidade judicial em casos de incumprimento contratual e receios quanto à rigidez futura das rendas. Ainda assim, surgiram novas plataformas digitais, algumas com apoio governamental, que oferecem garantias parciais, seguros de renda e gestão simplificada. Aqui, as PropTechs que responderem com soluções reais de mitigação de risco poderão encontrar um nicho crescente.
As novas Leis da Imigração e da Nacionalidade: o verdadeiro divisor de águas
A mais recente alteração jurídica, aprovada a 16 de Julho de 2025, traz mudanças profundas:
- A eliminação do mecanismo de manifestação de interesse, que permitia regularizar imigrantes com vínculos laborais, elimina uma via de acesso à residência amplamente usada.
- O novo visto de procura de emprego exige altas qualificações e tem critérios de validade muito mais rígidos.
- A proposta de revisão da Lei da Nacionalidade (prevista para Setembro) pretende duplicar o tempo de residência legal necessário à naturalização: de 5 para 10 anos.
Estas medidas representam um claro desincentivo à fixação de estrangeiros em Portugal. Isto afeta diretamente os segmentos imobiliários mais influenciados por fluxos migratórios:
- Desde jovens brasileiros e africanos da diáspora, até reformados europeus à procura de um regime fiscal mais vantajoso ou empreendedores digitais atraídos pelo clima e custo de vida.
- Com processos mais longos e incertos, a decisão de compra tende a ser adiada ou abandonada.
Seja para Golden Visa, seja para residência via trabalho, Portugal poderá estar a ser encarado como um destino de investimento menos acessível e menos previsível, dois fatores que poderão pesar na decisão de investir em imobiliário
Sustentabilidade e Reabilitação: um dos poucos consensos
Apesar de todas as tensões, mantém-se firme a aposta pública e privada na reabilitação urbana sustentável. Com fundos europeus ainda disponíveis e um impulso ESG cada vez mais forte, este será provavelmente o eixo de crescimento mais estável no setor nos próximos anos. As oportunidades residem sobretudo em:
- Reabilitação energética de edifícios antigos (combinando eficiência com incentivos fiscais).
- Transformação de ativos subutilizados (como escritórios ou hotéis) em habitação acessível.
- Novos projetos de co-living, senior living e arrendamento acessível gerido por fundos institucionais.
As PropTechs especializadas em otimização energética, materiais inovadores ou monitorização ESG poderão beneficiar decisivamente neste novo ciclo.
Um setor em transição regulatória permanente
O mercado imobiliário português, em 2025, está a atravessar o que pode ser descrito como uma normalização forçada. As medidas legislativas mais recentes procuram responder a pressões sociais legítimas, mas em muitos casos, falham em articular-se com a realidade económica e os interesses dos investidores.
A redução do apelo do Golden Visa, o endurecimento da lei da imigração e as incertezas quanto à nacionalidade portuguesa colocam Portugal numa posição ambígua: quer continuar a atrair investimento, mas limita o acesso dos seus principais investidores. Resta saber se o país encontrará, com ajuda da inovação tecnológica no setor imobiliário, um novo modelo mais equilibrado, que combine atratividade, sustentabilidade e justiça social.