As eleições no maior partido da oposição trouxeram um novo ciclo político na oposição que é positivo para os portugueses. Ainda não sabemos se Luís Montenegro conseguirá cativar os portugueses como futuro primeiro-ministro, mas existem poucas dúvidas sobre a capacidade de mobilizar de imediato todo o PSD para o trabalho de oposição assertivo de que o país precisa, sobretudo numa era de maioria absoluta governativa e de enormes desafios económicos, com potenciais consequências sociais perigosas.

A combinação de taxas de juro crescentes, aumento dos custos de vida e estagnação estrutural da economia portuguesa para crescer, tem tudo para afetar as famílias e o tecido empresarial nacional de pequena e média dimensão. Isto tudo no meio de um turbulento conflito na Europa, que pode acabar com a globalização como a conhecemos – e cujo fim pode também afetar Portugal.

Uma oposição forte é por isso vital para que o país possa começar a pensar em crescer a sério, não ficando dependente da agenda de um só partido socialista que tem tido pouca disponibilidade política para produzir políticas públicas reformistas de médio prazo, capitalizando politicamente na enorme proteção que foi a política monetária do Banco Central Europeu e dos planos de crescimento da Europa. Se os atuais riscos se materializarem, só a famosa “bazuca” não será suficiente para tirar Portugal da cauda da Europa.

A robusta vitória de Luís Montenegro foi relevante para estabilizar internamente o PSD. Na verdade, pode dizer-se que, no maior partido da oposição, acabou a indefinição e a polarização interna dos últimos tempos, que prejudicou a perceção pública dos portugueses sobre aquela que é a alternativa política reformista em Portugal.

Ao fim da indefinição, junta-se, no discurso de vitória, o discurso de agregação de Luís Montenegro – lançando o repto a Jorge Moreira da Silva para ser parte ativa do novo ciclo político do Partido Social Democrata. Isto envia um sinal poderoso aos portugueses de que o partido terá uma liderança que irá construir as condições para unir todos. E esta é a primeira premissa para podermos começar de novo o trabalho de construção de uma solução política. Uma solução política que sirva Portugal, não uma que se sirva de Portugal. Uma que construa futuro com os portugueses e não uma que acentue divisões ou venda sonhos construídos sobre uma mão-cheia de nada.

No entanto, Luís Montenegro tem agora um gigante para acordar e reconstruir. É necessário repensar a estrutura interna para a nova forma de fazer política, avaliar a eficácia da sua mensagem política, atrair quadros com competência e motivados para transformar o país, modernizar a comunicação e, sobretudo, despertar, mobilizar e liderar a oposição séria ao governo socialista.

Na lista de grandes desafios políticos, o combate nas grandes autarquias urbanas será também muito importante consolidar-se como uma alternativa real. É nas áreas metropolitanas que residem os grandes desafios do futuro, e onde os partidos devem focar-se nas transformações das próximas décadas. As dificuldades dos jovens em emancipar-se e ter acesso à habitação e estabilidade de emprego para constituir família, as classes médias e as preocupações com impacte na transição digital e automação no emprego, as desigualdades salariais de género que persistem no século XXI, a questão da mobilidade, as dificuldades das comunidades em se adaptarem à sociedade e ao bem-estar comum, as regras de segurança urbanas e o respeito pela propriedade pública, são apenas alguns dos temas emergentes nos quais o Partido Social Democrata deve ter um papel relevante em termos de debate de políticas públicas de impacte local.

O distrito de Setúbal é o exemplo gritante desta última realidade. Uma região urbana decisiva, que tem sido progressivamente negligenciada durante décadas relativamente a novos investimentos, e que parece continuar votada ao esquecimento da agenda real do Governo. Na verdade, grande parte dos projetos públicos estruturantes continuam a ser executados a norte do rio Tejo, apesar de tantos projetos apresentados e tantas promessas. O PSD precisa também de investir para crescer e poder disputar este espaço. Precisa de o fazer de igual para igual contra o partido que é hoje o seu verdadeiro adversário autárquico nas principais áreas metropolitanas de Porto e Lisboa, o Partido Socialista.

Seja a nível nacional, seja a nível das bases autárquicas há muito trabalho pela frente para o novo líder da oposição. A eleição de Montenegro pode ser o momento zero da construção de um novo ciclo político em Portugal, talvez até o mais decisivo do século XXI, pelos estruturais desafios de transformação que se avizinham em diferentes quadrantes da nossa sociedade.