Tentar antecipar formulações para o mundo, países, economias, para daqui a 30 ou 40 anos, implica:
- Identificar as características e a dinâmica das forças motoras que, algures no tempo, começaram a modelar o mundo de hoje ou estão ainda a modelá-lo.
- Perspectivar as novas forças de futuro, do “Mundo do Amanhã” e, nesse contexto, ir identificando as conexões com o agora e seus impactos nas mudanças que têm vindo, estão a ser e vão ser operadas aos diferentes níveis das sociedades e economias.
Entendi e entendo que o “Mundo do Amanhã” começa a construir-se hoje, nomeadamente criando as condições para a recepção do novo – “fabricando” uma mentalidade adequada. Desenvolver acções por exemplo ao nível do ensino, ou seja, adaptando-o com as rupturas necessárias ao conhecimento das potenciais novas realidades.
A automação, o digital e a internet estão certamente entre essas forças determinantes da onda de mudança tecnológica, económica, cultural e societária que tem vindo a acontecer. Vão perdurar, mas interligadas agora com outras que começam a surgir com grande pujança e impactos previsíveis e imprevisíveis. Mas nem todas as sociedades estão a interagir e a integrar esta onda de mudança em tempo e dinâmica.
Por exemplo, em relação a várias tecnologias do mundo futuro, como a robotização das sociedades, a predisposição cultural à partida não é a mesma.
Os países do Ocidente e do Oriente não estão culturalmente em igualdade. Há da civilização oriental uma maior predisposição para aceitar/conviver com uma sociedade robotizada, exactamente por diferenças culturais de fundo, determinadas pelo seu espírito religioso de teor animista. Para as sociedades orientais, tanto os objectos materiais como os seres humanos são dotados de espírito.
Assim, sociedades como a japonesa, a coreana, a chinesa e outras são mais propícias a aceitar e conviver com os robots, a considerá-los numa relação de “companheirismo”, enquanto a sociedade europeia olha para os mesmos robots como simples máquinas ou então como manifesta ameaça. Mas os robots estão a penetrar a vida das pessoas e a ter cada vez mais aceitação, sobretudo nas camadas jovens.
Li, na última semana (22 a 28/10), sobre o sucesso e o entusiasmo que o robot criado na Universidade do Minho está a suscitar em alunos do pré-primário. A sua adesão divertida e o entusiasmo. Aceder ao conhecimento pelo divertimento “orientado” – uma forma de ensino bem mais ajustada à maneira de estar dos jovens de hoje.
Causou-me alguma surpresa pela negativa em ter lido que este projecto do robot português para o ensino não merece, para já, apoio do Ministério da Educação. Argumento: o ensino pré-primário não é obrigatório. Argumento míope é o mínimo que se poderá dizer. Esta forma de encarar o mundo vai contra a mentalidade do futuro e o pulsar dos jovens.
Em contrapartida, fiquei surpreendido pela positiva em saber que alguns municípios estão a adquirir esses robots para os integrar nas escolas da sua área. Que visões tão diferentes de alinhar no caminho do futuro! Li, ainda, através das palavras da Professora Universitária responsável pelo projecto que não se trata de formar “mini-programadores”, mas de uma forma de complementar o ensino. Óptima e acertada visão, em meu entender.
Os robots estão a penetrar em todos os domínios da vida humana: no ensino, na medicina, na locomoção, na assistência à população envelhecida, na assistência doméstica, na gestão, na advocacia, na banca, na comercialização, etc.. Ora, o nosso ensino já deveria estar a ser preparado em termos de futuro. E como nem tudo é feito/alterado de uma só vez, muito já deveria estar em implementação.
No Japão está em marcha uma concorrência acrescida entre grandes empresas, como a Toyota e a Honda, para ver quem vence a corrida da nova geração de robots. A Toyota já tem em linha um “assistente de enfermagem” baptizado com um nome feminino. A corrida está ao rubro, até porque o Japão tem a sociedade mais envelhecida do mundo e um défice profundo de “cuidadores” a que a sociedade não responde em termos humanos nem virá a responder, agravada ainda por limitações legais em termos de emigração. Os robots são pois a saída.
Há países de vanguarda nesta matéria da robotização e no top cinco temos: Japão, China e Coreia do Sul (países do oriente), EUA e Alemanha (países do ocidente).
Entre eles há uma diferenciação que tem a ver com a sua base tecnológica. Japão, Alemanha e EUA vocacionados para robots caros para a indústria e medicina; China e Coreia para os menos caros dirigidos ao consumidor. Na China, o mercado dos robots apresenta uma taxa de progressão acelerada, designadamente na área fabril. As empresas do têxtil por exemplo estão a sofrer uma profunda transformação com as linhas de fabrico a serem totalmente robotizadas e impactos complexos. Unidades de quatro mil e cinco mil empregos reduzidas a cerca de 15/20%, onde a qualidade de emprego muda radicalmente. As novas funções são agora exigentes em conhecimento.
Mas não é só a robotização das sociedades e das economias que está a bater à porta do ser humano e vai virar do avesso as sociedades. Com a agravante de cruzamentos entre si potenciadores de outras e complexas mudanças.
Outras actividades como a ciência/indústria do código genético, dos big data (ou seja a indústria dos dados, matéria-prima da era da informação em marcha), os avanços na inteligência artificial com os algoritmos cada vez mais inteligentes – quem desconhece a celeuma da sua utilização na “destituição” do juiz Carlos Alexandre do processo Marquês?! – e muitas outras ciências em dinâmicas diferenciadas.
Há muitas reflexões de fundo, em défice, sobre estas matérias. As encruzilhadas são muitas e cada vez mais. Uma lacuna visível. Um país, por pequeno que seja, não pode alhear-se a estas transformações radicais que se aproximam. Tem de criar os seus instrumentos de observação montando uma “estrutura” institucional, flexível, como já aqui referi, para acompanhar estas dinâmicas de mudança no sentido de produzir dados úteis à Sociedade. Uma visão de futuro precisa-se!
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.