“Estamos a chegar agora a um ponto em que a linguagem da Psicologia começa a ser apropriada para compreender o comportamento destas redes neuronais (Inteligência Artificial)”. Estas foram as palavras do cofundador e engenheiro responsável pela criação do ChatGPT, Ilia Stuskever, numa entrevista em que se debatia a evolução da Inteligência Artificial (IA) e a crescente necessidade de se investir em soluções para o “problema do alinhamento” com a IA.

Mas, antes de continuar, alguns apontamentos que nos poderão ajudar a compreender porque é que a questão de alinhamento da IA é uma necessidade. O “problema de alinhamento” foi inicialmente definido pelo pioneiro em IA Norbert Wiener, em 1960, da seguinte forma: “Se, para atingir os nossos propósitos, usarmos uma agência mecânica (IA) em cuja operação não podemos interferir efetivamente, é melhor garantirmos que o propósito que colocamos na máquina é realmente aquele que desejamos”.

Logo, direcionar/alinhar os sistemas de IA aos objetivos e interesses pretendidos pelas pessoas favorece resultados menos racistas e enviesados, e diminui outputs indesejados. O objetivo é que estes sistemas sejam legais, éticos, robustos e interpretáveis, e ainda centrados nas necessidades do ser humano.

Com o surgimento do ChatGPT, da OpenAI, e com o estrondo com que se popularizou (foi a tecnologia que mais rapidamente chegou aos 100 milhões de utilizadores), as questões ligadas às capacidades, riscos e perigos de sistemas baseados em IA são notícia todos os dias. À medida que evoluem e se tornam mais prevalentes e autónomos, existe a necessidade de codificar nos modelos de IA os incentivos e valores que, enquanto sociedade, pretendemos ver refletidos neste novo tipo de tecnologia.

O problema do alinhamento é uma preocupação central no desenvolvimento da IA. Trata-se de garantir que os sistemas de Inteligência Artificial atuam de acordo com os interesses e valores humanos, minimizando comportamentos indesejados ou imprevisíveis. A dificuldade em alinhar os objetivos da IA com os dos seres humanos é um desafio importante que pode ter implicações significativas na segurança e na ética da aplicação da IA.

Segundo Stuskever, estamos a chegar a um ponto em que a linguagem da Psicologia começa a ser apropriada para compreender o “comportamento” destas redes neuronais. Uma afirmação que sublinha a importância da Psicologia e dos psicólogos no processo de resolução do “problema de alinhamento”.

Ao estudar o comportamento humano e os processos mentais, a Psicologia pode fornecer insights valiosos para entender como estas redes neuronais processam informação e tomam decisões. Os psicólogos, com o seu conhecimento aprofundado sobre as motivações, emoções e mecanismos cognitivos humanos, podem contribuir para a criação de sistemas de IA mais seguros e eticamente responsáveis, podendo auxiliar na criação de estratégias para lidar com os impactos psicológicos e sociais da IA na vida quotidiana das pessoas.

Ao abordar o “problema de alinhamento” na IA, torna-se evidente a relevância da Psicologia no desenvolvimento de sistemas de IA seguros, éticos e centrados no ser humano. Atualmente, estamos a testemunhar uma explosão de inteligência, com avanços tecnológicos cujos impactos ainda não conseguimos antecipar por completo. Nesse contexto, a convergência entre IA e Psicologia é crucial para enfrentar os desafios inerentes à compreensão do comportamento destas redes neuronais e à incorporação dos valores e interesses humanos.

Os psicólogos, com o seu saber acumulado no domínio dos processos mentais e comportamento humano, têm um papel importante a desempenhar, trazendo contribuições valiosas para o desenvolvimento da IA e ajudando a minimizar os riscos associados à sua aplicação. O investimento na cooperação entre essas áreas é fundamental para assegurar que os progressos tecnológicos beneficiam a sociedade, respeitando os princípios éticos e as necessidades humanas, mesmo diante dessa rápida evolução e dos impactos ainda desconhecidos que a IA irá trazer ao nosso quotidiano.

O autor assina este artigo na qualidade de responsável pela relação entre a psicologia e a tecnologia na Ordem dos Psicólogos Portugueses.