Younes Abouyaaqoub tinha 22 anos. Nascido em Marrocos, vivia desde criança na Catalunha, na cidade de Ripoll. Gostava de carros, era fanático de futebol e praticava escalada. Era bom aluno e tido como exemplo pelos pais dos seus amigos. Tinha um emprego estável como soldador numa empresa metalúrgica, sendo considerado um trabalhador exemplar. Ajudava os vizinhos a subir as compras do supermercado nas escadas. Era considerado simpático, generoso e alegre por quem o conhecia.
Após ter sido radicalizado pelo Imã Es Satty, um certo dia, Younes decide conduzir uma carrinha contra uma multidão nas Ramblas. Uma rua do mundo, conhecida pela sua diversidade cultural, onde todos os dias circulam pacificamente cidadãos de todas origens, raças e religiões. Younes não se detém no primeiro atropelamento, nem no segundo. Continua com frieza e determinação uma e outra vez até matar 13 pessoas e ferir mais de uma centena.
Após embater com a carrinha que conduzia contra um quiosque, sai da mesma pelo seu próprio pé e caminha por Barcelona com tranquilidade. Para fugir do centro da cidade, consegue roubar um carro, não sem antes apunhalar até a morte o seu dono, o catalão Pau Perez. Depois de uns dias fugido, Los Mossos localizam-no em Subirats, perto de Barcelona. No momento do confronto com a polícia, Younes usava um colete bomba falso e foi baleado mortalmente. Talvez desejasse a própria morte.
Os detalhes mais sórdidos desta história de terror circulam pelo mundo como se de uma novela se tratasse causando estupefação e revolta. Como pode Younes passar de jovem exemplar a monstro que mata a sangue frio e sem escrúpulos civis inocentes? Como pode alguém perder o respeito pela sua própria vida e pela dos outros? O que foi necessário para quebrar a mente deste jovem? O que pretendem estes terroristas afinal? Quais os seus verdadeiros objetivos? Quem são os culpados?
Esta revolta interior, este sentimento de impunidade, de incompreensão, de necessidade de justiça que sentimos é precisamente um dos principais objetivos do terrorismo islâmico. É verdade que os fundamentalistas pretendem a desforra histórica das cruzadas, que procuram o martírio, que buscam ganhos nas disputas territoriais do ambicionado califado. Porém, acima de tudo, os terroristas islâmicos pretendem provocar medo e consternação, pretendem chocar-nos. Sabem como funcionam os media ocidentais. Sabem como funciona o viés cognitivo da associação islão/terrorismo. Sabem que a cada atentado será mais difícil conciliar a opinião pública ocidental com o islão. E é esse o confronto que pretendem.
De nada serve dizerem-nos que é mais provável ser atropelado por um carro, morrer num acidente de viação, ser morto num assalto ou ser atingido por um raio do que morrer num atentado terrorista. De pouco serve intelectuais, políticos, líderes espirituais, eu próprio neste artigo dizermos que o Islão é paz e não terrorismo. O nosso cérebro, depois de saber os contornos chocantes da história de Younes Abouyaaqoub, vai cair no viés cognitivo e a islamofobia vai crescendo. Não será por acaso que os terroristas islâmicos procuram formas cada vez mais chocantes de executar os atentados. Talvez não sejam as mais eficazes, mas são as mais chocantes.
É precisamente este o paradoxo que enfrentamos: os terroristas executam atentados porque querem chocar a opinião pública ocidental e aumentar o fosso entre o Ocidente e o Islão. E o que fazemos nós? Garantimos, através dos media, que todo o mundo ocidental fica chocado com as imagens e história dos acontecimentos. O nosso sistema e o nosso comportamento estão a incentivar o terrorismo.
Não deveríamos procurar frustrar os objetivos dos terroristas? Deveria eu conhecer os sórdidos detalhes da história de Younes Abouyaaqoub? Até que ponto seria legítimo restringir a liberdade de imprensa em situações de atentados terroristas? Não deverá prevalecer neste caso o valor da segurança e da vida sobre o da liberdade de imprensa? É um debate em curso que deveremos encarar com muita seriedade.