À semelhança de outros países desenvolvidos, Portugal vai sair da atual crise ainda mais endividado. A dívida pública atingiu um recorde em 2020, de 133,7% do Produto Interno Bruto. Em termos nominais, estamos a falar de 270,4 mil milhões de euros. São números impressionantes, mas que não podem ser interpretados de forma isolada.

A dívida de Portugal cresceu menos do que a de outros países europeus desde o início da pandemia e o seu custo permanece em níveis geríveis. Como lembrou recentemente a agência Moody’s, que mantém o outlook positivo para a dívida portuguesa, em 2020 o peso dos juros em relação às receitas do Estado situou-se nos 7%, ficando abaixo dos 10% de 2015. E isto num ano péssimo para a atividade  económica, devido à pandemia, que fez o PIB cair 8,5% e a receita fiscal descer 6,2%.

Quer isto dizer que o elevado endividamento do país não é um problema grave? Longe disso, pois ninguém sabe durante quanto tempo se poderão manter os juros em níveis historicamente baixos. O BCE não poderá manter os estímulos para sempre e, além disso, não estamos livres de uma crise política ou outro acontecimento que nos fragilize aos olhos dos mercados.

Assim sendo, a dívida pública terá de voltar o quanto antes à trajetória de descida (relativa, em proporção do PIB) que existia antes da pandemia. Para isso, e para manter o nosso modelo social, precisamos de um crescimento económico que seja robusto e sustentável no médio e longo prazo. E é aqui que a questão se complica. Será que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) cria condições para que ocorra esse crescimento robusto que nos escapa há mais de duas décadas?

No imediato, dada a grande fatia dos fundos destinados à esfera estatal (73% dos 13,9 mil milhões de euros previstos em subvenções), o PRR terá efeitos positivos no défice e na dívida pública, até porque o Governo está a ser cauteloso, procurando evitar os empréstimos previstos no plano europeu. Mas tanto peso do Estado, em detrimento do apoio às empresas e à qualificação dos portugueses, dificilmente criará condições para que Portugal possa crescer a sério e finalmente mudar de vida, deixar de divergir da Europa e reduzir a dívida.