Estas eleições demonstraram, uma vez mais, que o povo português continua, na sua aparente pacatez, a dar lições de inteligência de grupo. E com esta frase, o objetivo deste artigo não pretende defender qualquer partido, mas procurar contribuir para uma análise de gestão estratégica de comportamentos dos micro grupos que são os partidos, os quais ambicionam influenciar a vida de um grande grupo: a população de todo um país.
A realidade é que, em todas as eleições, fico cada vez mais com a sensação que quanto maiores as ambições individuais, mais ou menos evidentes, dentro dos partidos, maior a cegueira, como grupos de influência, perante as realidade à sua volta. É famoso o caso de, perante vários dados evidentes e disponíveis, ninguém ter colocado as questões certas a Kennedy para reavaliar a sua decisão e ambição estratégica no que se consumou como um desembarque fatal na Baía dos Porcos em Cuba, no ano de 1961.
Dá a sensação de que as paredes das sedes partidárias toldam a visão estratégica e a realidade do povo que as rodeia. Uma espécie de esquecimento de que o “mundo lá fora” é maior do que o grupo daquelas salas partidárias, implicando naturalmente a visão distorcida das necessidades de quem servem, mesmo perante vários dados evidentes. Trata-se da criação de fenómenos enviesados do mundo, em busca de uma justificação para um mundo que não existe.
Ou seja, de um ponto de vista estratégico, há um foco certo no objetivo final que qualquer partido tem para uma sociedade, mas um ponto de partida de análise errado, com criações de uma realidade inexistente para criar a justificação de ações no presente. Tal como Kennedy procurou obviar vários dados de uma realidade presente não existente, da qual se serviu, para alcançar o objetivo final.
A aplicação de modelos de liderança servidora, estruturada por Robert Greenleaf, nos anos 70, e alavancada por Ken Blanchard para o mundo empresarial, nos anos 80 do século passado, fazem falta também na cultura partidária para garantir uma visão pragmática do presente. Mas a realidade é o que é!
O último ano político cegou a ambição, com a criação de realidades inexistentes e ambições impraticáveis, por parte dos partidos que apoiavam a estabilidade governativa. Acresceram a este facto as quezílias histéricas e de ambições pessoais, de poder pelo poder, internas nos partidos tradicionais de direita, os quais acabaram por transmitir claramente visões da famosa música da revolução de Abril do “eles querem tudo e não deixam nada”. O povo entendeu e foi implacável para com estes factos.
Com isto, o partido de Governo, que sentia na pele o dia a dia da população, estrategicamente jogou a cartada decisiva de ir de novo à grelha da partida, libertando-se de amarras e encostando diretamente, na primeira volta, aqueles que com ele caminharam juntos numa estrada pela via mais à esquerda.
Adicionalmente, houve a brecha aberta pela tradicional direita, que esteve mais preocupada com as estratégias e preocupações individuais internas, esquecendo a realidade do país e achando que resolveria as mentes dos eleitores em 15 dias de campanha eleitoral! Desta forma, a nova vaga da direita foi, obviamente, e de forma estratégica, criando as suas mensagens, consistentes, ao longo dos últimos anos, com a consequente sustentação de um eleitorado não volátil a sound bites de campanha.
Conclusão, o povo português, como alguém disse, “não falhou!”. Mas deu mais uma nova lição sobre a consistência estratégica e não ziguezagueante dos umbigos partidários.