É sempre muito perturbador quando, por entre a catástrofe humanitária, nos vemos forçados a falar da dimensão económica de uma guerra, mas é também inevitável no caso de um conflito com as repercussões à escala desta invasão da Rússia à Ucrânia e que se reveste de características inéditas a vários níveis, a começar pela dimensão das sanções colocadas em prática pela União Europeia e do seu ativo envolvimento.
De rastos, a queda abrupta da economia russa obrigou já esta semana os moscovitas – e não serão obviamente caso único – a esgotarem as caixas de levantamento automático na sua tentativa de salvaguarda das poupanças, temendo o colapso do rublo e estando impossibilitados de utilizar os sistemas internacionais de pagamento enquanto o receio dos banqueiros é o de que se esgote a liquidez das instituições financeiras, embora o país tenha um significativo excedente da conta corrente que acumulou reservas cambiais recorde de 630 mil milhões de dólares.
É a justa paga pelas ações cometidas, dirão alguns. Mas é triste quando populações inocentes são forçadas a pagar os desvairos de um ditador que parece não ter quaisquer escrúpulos em fazer sofrer o seu próprio povo, para além dos outros além-fronteiras.
Como alertam diversos analistas, as consequências económicas a longo prazo para o resto do mundo serão muito menos severas do que para a Rússia, mas não deixarão por isso de vir a ser um desafio para os decisores políticos. Mas uma coisa parece infelizmente certa; vamos assistir a um período em que os orçamentos alocados à Defesa vão subir consideravelmente e isso irá levar à alocação de verbas para gastos militares que não irão assim poder ser canalizados para o investimento em educação, cuidados de saúde, ou infraestruturas, diminuindo assim a qualidade de vida dos cidadãos.
De acordo com a “The Economist”, as implicações globais imediatas passarão por uma inflação mais elevada, um crescimento mais baixo, abrandamento do consumo e investimento e alguma perturbação nos mercados financeiros à medida que as sanções mais profundas se instalarem. As consequências a longo prazo serão uma debilitação do sistema de cadeias de abastecimento globalizadas e de mercados financeiros integrados que tem prevalecido na economia mundial desde o colapso da União Soviética em 1991.
A curto prazo, como alertou e bem a Reuters, as repercussões incidirão nos bancos mais expostos ao dinheiro russo. Na Europa, são os bancos italianos e franceses que têm a maior exposição, representando pouco mais de 25 mil milhões de dólares cada no final de Setembro, seguidos pelos bancos austríacos com 17,5 mil milhões de dólares, de acordo com dados do BIS – Bank of International Settlements divulgados pela agência noticiosa.
Entre nós, como noticiou a revista “Exame”, a exposição é bastante inferior e mesmo o peso da economia russa como mercado de destino das nossas exportações é de pouca relevância, valendo 0,28% das exportações e 0,99% das exportações para fora da União Europeia em 2021, passando essencialmente por cortiça, máquinas e produtos animais, para além do vinho. Mesmo assim, a guerra provocará sérios efeitos ao nível dos preços da energia e de alimentos como o pão e a carne.
O mundo mudou e devemos preparar-nos para os dias difíceis que virão.
A presidente da Comissão Europeia tem vivido um mandato atribulado devido aos acontecimentos mundiais, mas tem sabido corresponder aos enormes desafios surgidos. Entretanto, para a História e a memória futura ficará a postura lamentável dos eurodeputados do PCP que votaram contra a proposta da Comissão para a atribuição de uma ajuda de emergência à Ucrânia, e a abstenção dos eurodeputados do Bloco de Esquerda.