Escrevo este artigo do Ruanda, onde tenho vindo a trabalhar os temas de financiamento climático junto do setor financeiro. Aliás, o ano de 2024 deu-me a oportunidade de trabalhar estes temas de forma mais profunda em Angola, Moçambique e Ruanda, o que me faz ter hoje uma visão mais realista do empenho, esforço e dedicação que existe em África para se incorporar os riscos climáticos nas políticas nacionais, na gestão do financiamento e em encontrar as soluções necessárias para colmatar os problemas decorrentes das alterações climáticas que já se fazem sentir hoje na economia.

Enquanto na Europa ainda parece irrealista pensar-se que um aumento da temperatura pode levar ao aumento da inflação, em África esta ligação é já hoje compreendida por todos porque ela já existe: os preços já aumentam quando há secas ou quando há um deslizamento de terras provocado por uma chuva inesperada. O efeito é imediato e as consequências negativas na economia também são imediatas. E ocorre todos os anos, e cada vez de forma mais frequente.

Em muitos países africanos, o aumento da temperatura – provocado pela Revolução Industrial, Tecnológica e Digital promovida pelos países desenvolvidos – está a levar a um aumento de ciclones, cheias e destruição completa e frequente de cidades e infraestruturas básicas, como habitações, estradas, pontes, etc. Quando estes eventos acontecem, geram perdas e danos nos países em desenvolvimento, e estes precisam de empréstimos por parte dos países desenvolvidos para conseguirem ter capacidade financeira para recuperar e reconstruir de novo as infraestruturas destruídas.

Vejamos o que está a acontecer: o aumento da temperatura deve-se ao impacte do desenvolvimento que os países do Norte do hemisfério tiveram nos últimos 130 anos, assente nos combustíveis fósseis, crescimento industrial e de comércio que levou ao aumento das emissões de CO2 e que está a levar ao aumento da temperatura em todo o mundo.

Agora, o outro lado. África é das regiões do globo que mais sofre com os impactes deste aumento da temperatura, devido às suas caraterísticas geográficas, geofísicas e humanas. Por isso, vemos hoje cidades e vilas devastadas por cheias e chuvas intensas, perdas de produção agrícola e doenças decorrentes desses condicionalismos. Pois bem, para conseguirem socorrer a população, os países africanos precisam de dinheiro para reconstruir o que foi destruído e, para isso, recebem empréstimos dos países desenvolvidos, aos quais têm de pagar um juro. Ou seja, e citando um amigo, esta situação pode ser relatada da seguinte forma: “O meu vizinho destrói-me casa e eu ainda lhe pago por isso”.

É neste contexto que o apoio a África deve ser repensado. Estando tantos países africanos já estrangulados com dívida internacional, os desastres climáticos estão a levar a um aumento ainda maior do endividamento externo, e quem lucra com isso são os financiadores internacionais que causaram o problema. Não é possível considerar-se este sistema, como um sistema justo.

Assim, o perdão da dívida aos países africanos em troca de projetos que possam contribuir para a adaptação climática de África, deveria ser visto como uma das soluções justas que podem fazer a mudança. Portugal poderia muito bem desenvolver esta abordagem e usar os PALOP como um caso de estudo de como os green debt swaps podem constituir soluções reais e úteis para África, e, em simultâneo, redimir-se do seu passado, olhando para o futuro.

Existem muitos investidores internacionais, muitas organizações multilaterais, fundações e fundos que estão ávidos por investir em green debt swaps. Esta poderia ser uma das apostas da política internacional de desenvolvimento de Portugal, que ganharia, sem dúvida, uma projeção internacional significativa. Seria bom para os PALOP e seria bom para a economia portuguesa, pois iria atrair mais investimento internacional também para Portugal. E seria ótimo para a projeção internacional do político que tivesse a coragem de liderar esta iniciativa.