O bendito vírus da Covid não podia ter aparecido em melhor altura ao nosso Governo. É um bicho com particularidades curiosas até. É claramente religioso – aparece em tudo o que é festa cristã, desde a Páscoa ao Natal, passando, claro, pelo Dia de Todos os Santos… É um bicho tranquilo – não aprecia futebol, não frequenta corridas de automóvel nem vai a touradas. Que de touradas, deve ele pensar, está este país cheio e ele, farto.

Também já percebemos que é um tipo que gosta da noite, depois das 20h começa a dar-lhe no álcool e no tabaco.

Tem poder económico. Não frequenta transportes públicos mas vai à neve. Há surtos nas escolas privadas mais caras do país mas não há nas escolas públicas. Há em restaurantes de luxo mas não em cantinas.

Aparentemente, em países comunistas e ditatoriais praticamente não existe, na Coreia do Norte nem entrou!

É um animal determinado – nas festas promovidas pela CGTP ou PCP não entra, não importuna nem maça quem nelas participa.

(Já eu, que promovi uma ida ao teatro entre quatro amigas, foi um caso sério para comprar bilhetes “para um grupo”).

Feito o diagnóstico, que orientações têm sido seguidas? Ninguém percebe – coerência, não existe. Exemplo, não se vê. Planeamento, desconhece-se. Gestão de recursos, não fazem. Outras doenças, não importam.

O Governo desrespeita a constituição, impede a livre circulação de pessoas, assume um autoritarismo nunca visto e, cereja no topo do bolo, alimenta uma escalada de pobreza de que o país dificilmente se vai recompor.

O SNS não corre o risco de entrar em ruptura com a Covid. O SNS já estava em ruptura há muito tempo. E nos anos Centeno, em que se previam no orçamento investimentos que nunca foram realizados por uma coisa que se tornou moda chamada cativações, só piorou.

Mas quando vêm milhões de euros para Portugal, alguém ouve falar num plano de investimento sério e robusto para o SNS? Não, percebemos que o comboio de alta velocidade Lisboa-Porto volta a ser notícia, o aeroporto do Montijo continua válido e a aposta no hidrogénio é uma garantia. De resto, não se ouve nada de jeito. A não ser, claro, que uma proposta na Assembleia para criação dum portal de transparência e monitorização dos fundos europeus foi chumbada, claro, isso tinha lá algum jeito…

À conta da Covid vão morrer milhares de pessoas – com doenças que podiam ser tratadas mas que não chegam a ser diagnosticadas – à fome porque deixaram de ter sustento. Vão definhar milhares de pessoas com doenças mentais. Vão adoecer muitos profissionais. Médicos, de exaustão. Enfermeiros e auxiliares, de cansaço. Professores, “gostava” eu de saber de quê, quando têm de falar horas a fio de máscara. Vão morrer idosos, sozinhos. Vão crescer crianças sem saber brincar. Vão crescer adolescentes sem saber partilhar. Vai morrer uma sociedade que já era egoísta antes da Covid e que vai ser irremediavelmente doente depois da Covid.

Enquanto isto, a Covid vai ter as costas mais largas da história económica portuguesa. Chegou no momento certo para um Governo que a aproveita ao máximo para amedrontar a população e assim, passo a passo, ir tomando conta das instituições. Na Procuradoria Geral da República, Joana Marques Vidal estava a ser incómoda, saltou! Para o Banco de Portugal vai Mário Centeno – temos o Novo Banco ainda a mexer e há-de chegar o dossier Montepio, que é bom ter controlado.

E sabem que Mário Centeno enquanto ministro das Finanças escolheu os elementos do conselho de auditoria que têm como missão avaliar o trabalho do Governador do Banco de Portugal – e ainda aprovou aumento das suas remunerações. Uau, é difícil imaginar melhor quando todos, a começar por ele, sabia(mos) que sairia do Governo para o Banco de Portugal.

No Tribunal de Contas, Vítor Caldeira estava a levantar muitas questões. Saltou! Combate à corrupção? Esqueçam! Aliás, a organização Transparência e Integridade chamou já a atenção para o vazio que é a proposta de combate à corrupção apresentada pelo Governo que deixa de fora as funções políticas, financiamento político, branqueamento de capitais, enriquecimento ilícito, regime de incompatibilidades e contratação pública. Na realidade, todas onde pode e deve existir mais corrupção.

Mais recentemente, a presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP), Nazaré da Costa Cabral, tornou pública a sua preocupação com as previsões inscritas no Orçamento do Estado para 2021 que, considera, “comportam riscos descendentes não negligenciáveis, nomeadamente, a incerteza em torno da pandemia que poderá levar a um impacto superior ao previsto de algumas das medidas inscritas, mas também que o impacto da despesa com a TAP e o Novo Banco seja superior ao previsto”. Cheira-me que pode ser a próxima a ser “despedida”…

Como digo há meses, nunca o Atlântico foi tão estreito – estamos aqui estamos uma Venezuela! Havia um ditado que dizia, “fia-te na virgem e não corras”, eu diria “fia-te na máscara e não te imponhas”.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.