O sector social necessita aprender com a gestão do sector empresarial. E vice-versa.

A primeira frase é comumente conhecida e tem sido alvo de muitos debates. A segunda poderá ser considerada mais surpreendente, mas creio que é muito verdadeira também. É sobre esta vertente que me quero debruçar hoje.

Sou gestor com 27 anos de experiência no sector empresarial (não social), mas com vasto contacto com organizações do sector social, tanto ao nível de consultoria como de formação.

Quando iniciei esta relação com o sector social, as usuais ideias pré-concebidas vieram-me todas à cabeça: falta de competências de gestão, salários baixos, pouca formação, ineficiências, pouca sustentabilidade financeira… O meu raciocínio imediato foi: “vou-lhes ensinar algumas coisas!”. Mas, ao longo do tempo, fui percebendo que afinal esta era uma relação bidirecional (ou win-win, como nós gestores gostamos de dizer).

Tentei racionalizar e perceber o percurso que tive de fazer para passar de um “mindset de gestor empresarial” para um “mindset de gestor de uma organização social”. Cheguei a seis palavras: (1) Simplificar, (2) Não julgar, (3) Ter empatia, (4) Ajustar, sem perder rigor, (5) Explicar e (6) Demonstrar.

A necessidade de “simplificar” prende-se com o facto de a linguagem não ser uma linguagem comum, pela base de formação dos intervenientes ser diferente (trabalhadores da organização e gestor empresarial) mas também pela diferente complexidade das organizações. O gestor empresarial tem que simplificar o seu discurso, para que a sua mensagem passe.

O “não julgar” está também relacionado com as menores competências de gestão que uma organização social tende a ter, o que faz com que o gestor empresarial deva ter a preocupação de não fazer julgamentos injustos – por vezes não se faz melhor pela simples razão que não se sabe como o fazer. Por isso o “explicar” é essencial.  Qualquer líder tem obrigação de ensinar, influenciando a maneira de pensar e de agir das pessoas à sua volta. No sector social esta necessidade é particularmente importante.

E isto leva à necessidade de o gestor empresarial ter “empatia” e “ajustar” o seu comportamento. O meio ambiente de uma organização do sector social tende a ser diferente do meio ambiente de uma empresa comercial, tanto ao nível da sua missão como dos seus stakeholders.  Por isso, o gestor empresarial tem que se adaptar. Novamente, sob o risco da sua mensagem não passar.

O “demonstrar” é fundamental. É necessário demonstrar de forma inequívoca o impacto positivo que as ações da boa gestão têm. Tendencialmente, no sector social a palavra “lucro” tem um sentido pejorativo, pelo que a forma mais adequada que se pode usar é a demonstração de uma relação causa-efeito positiva. Por exemplo, dizermos que é necessário ter-se poupanças nos custos é importante. Mas dizermos que se pouparmos 1.000 euros por mês conseguimos pagar um professor de música aos alunos da creche da organização, despertará mais a atenção e fomentará mais a ação. É um call-to-action mais eficiente.

Foram estas as seis palavras que racionalizei quando quis perceber o que precisaria fazer para me ajustar à gestão de uma organização do sector social.

Mas se nos abstrairmos do assunto em análise e olharmos de novo para estas seis palavras, facilmente nos apercebemos que elas nos fazem lembrar algo: todas elas podem ser associadas a características que um gestor líder deve ter: (1) bom comunicador (2) sem julgar (3) empático (4) aberto a opiniões diferentes (5) formador (6) que mede resultados e gere pelo exemplo.

É esta uma das vantagens que uma experiência no sector social poderá trazer ao gestor empresarial: uma aprendizagem on-the-job, um mergulho inesperado naquilo que desde sempre nos ensinaram que devemos fazer para ser melhores gestores. Mas, neste caso, com um grande sentido prático e um ainda maior sentido de urgência:

  • temos trabalhadores à nossa frente que se querem tornar melhores trabalhadores connosco;
  • temos organizações que foram criadas com base no sonho de alguém, mas que precisam que as ajudemos a dar o próximo passo para que continuem a ter impacto;
  • temos beneficiário que precisam destas organizações e que terão as suas vidas negativamente impactadas se não agirmos.

E temos depois o nosso sentimento. O sentimento de missão e de propósito que obtemos à medida que vamos cumprindo esta tarefa. A maior abertura com que vamos trabalhar para a nossa empresa no dia seguinte, mais disponíveis para corrigir o erro das nossas equipas e reconhecer e valorizar as diferenças.  Numa frase: o sentimento de ter contribuído para o Valor Social criado pela organização.

O autor escreve este artigo na qualidade de Professor no curso Liderança Social para Gestores da Nova SBE