Foi há dez anos que o colapso da Lehman Brothers desencadeou uma das maiores crises internacionais do sector financeiro. À data, exigiu-se mais regulação para o sector bancário e financeiro. Com a crise da dívida soberana na União Europeia, que contagiou vários sistemas bancários nacionais, em particular o português, continuou a pedir-se mais regulação, mas também melhor regulação.

Estes acontecimentos deram origem, pelo menos na União Europeia e Portugal, a um furacão legislativo que exigiu aos agentes de mercado um grande esforço de adaptação a novas regras. Contudo, o movimento ainda não acabou e são muitos os desafios que estão pela frente.

Desde logo, a 1 de janeiro de 2018, entrou em vigor a nova norma contabilística IFRS 9 que, entre outras medidas, determina novas exigências ao nível do reconhecimento e cálculo antecipado de perdas em operações de crédito, obrigando os bancos à criação de novas metodologias e procedimentos contabilísticos.

A 13 de janeiro termina o prazo de transposição para os Estados-Membros da Diretiva de Serviços de Pagamento II (PSD2), que aumenta a concorrência para os bancos, que passam a estar obrigados a dar acesso a empresas tecnológicas e outros bancos que queiram entrar no mercado de serviços de pagamento. Mediante autorização do titular de uma conta bancária, os bancos passam a ser obrigados a permitir o acesso de uma terceira parte às informações dessa conta para a prestação de serviços de pagamento de informação financeira.

Assim, é possível que durante o próximo ano um consumidor consiga fazer compras no seu smartphone diretamente a partir da aplicação do Facebook, por exemplo. Os bancos terão de criar uma plataforma dedicada com informações de clientes para dar acesso a estas novas terceiras partes ou, em alternativa, permitir o acesso às suas próprias plataformas de informação. Os desafios ao nível tecnológico e da segurança de dados e sigilo bancário são enormes.

No que respeita à financeira, os desafios que se colocam aos fundos, sociedades gestoras e outros intermediários financeiros, onde se incluem bancos, decorre da transposição da segunda Diretiva dos Mercados e Instrumentos Financeiros (DMIF II). Esta diretiva introduz alterações às regras de comercialização de valores mobiliários e outros instrumentos financeiros, novas limitações à comercialização de derivados de balcão (OTC) e cobrança de comissões.

Estes são os três desafios macro (IFRS 9, PSD2 e DMIF II) que têm origem legislativa, apesar das diversas consequências contabilísticas, de mercado, financeiras e tecnológicas que se colocam. No entanto, o reforço e conclusão de uma união bancária na União Europeia, a perspetiva de criação de um fundo de garantia de depósitos comunitário ou o Brexit trarão consigo outras exigências que darão continuidade a este movimento de mais e melhor regulação para o sector bancário e financeiro.

Estes desafios colocam os vários stakeholders do sector bancário e financeiro perante um esforço de adaptação a novos deveres e normas. Por outro lado, algumas dessas normas (PSD2) abrem mercado a novos agentes, criando novos serviços e oportunidades para novos produtos que poderão oferecer aos consumidores um mercado de serviços mais transparente, competitivo e eficiente.

Estas evoluções não são isentas de contrapartidas; os consumidores ficam mais expostos a novos riscos de fraude e outros relacionados, que se agravam pelo facto de o prestador de serviços de pagamento ser cada vez mais uma entidade virtual e distante e sem um interlocutor para responder diretamente a questões dos clientes. Espera-nos um período de teste para o sector bancário e financeiro, cujas mudanças podem levar à reformulação dos serviços e à forma como os mesmos têm até aqui sido prestados.