A eutanásia tem sido bastante debatida em Portugal nos últimos anos. Precedem-nos mais de 40 anos de debates em países como a Holanda ou os Estados Unidos, logo partimos de uma base diferente.

Em Portugal, estes debates já obrigaram a dois pareceres do CNECV (1997 e 2018), desta última vez após um intenso ano de debates, mensais e regionais, patrocinados pelo Presidente da República. O próprio Presidente veio dizer que o debate na sociedade portuguesa tinha sido adequado e suficiente. Caminhamos para o quinto ano sucessivo de debates sobre este assunto.

Os partidos que entenderam pronunciar-se fizeram-no nos seus programas eleitorais, muitos na sequência de projectos de lei próprios oportunamente apresentados e discutidos na Assembleia da República (em 29 de Maio de 2018).

Quase todos puderam manifestar-se. Circularam 1,5 milhões de panfletos da Igreja contra a despenalização. Cavaco Silva testemunhou contra o líder do seu próprio partido ao dizer ser inadmissível votar em alguém que concordasse com a eutanásia. Por isso entendo que não só houve debate suficiente, como tem havido, e que em 6 de Outubro os portugueses escolheram quem queriam e conheciam quem escolheram.

Os deputados eleitos representam o sentimento da nação. Muito melhor do que ordens profissionais ou que o capturado CNECV. Vários estudos recentes demonstram que a maioria dos portugueses e dos médicos portugueses é favorável à despenalização da eutanásia. Por isso, propor referendar este assunto, neste momento, é querer deliberadamente adiar decisões.

Não há (ou não devem existir) questões sensíveis ou complexas para a Assembleia da República, casa da nossa democracia, onde todos os assuntos devem poder ser estudados e discutidos, não só política mas também tecnicamente, ainda que recorrendo à ajuda de peritos.

Verifique-se, por exemplo, que a mudança de paradigma sobre o fim de vida já se deu há muito tempo. E nunca foi preciso referendá-la. Refiro-me à doutrina do consentimento informado do doente para todo e qualquer acto médico, o que inclui a recusa de um tratamento vital por motivos eventualmente fúteis (para terceiros). E que a morte já pode ser considerada uma alternativa melhor do que ser ventilado ou alimentado artificialmente nas circunstâncias concretas que um doente concreto entender mais dignas para si.

Questões mais práticas passam pela regulamentação da lei. Tomando como exemplo o aborto, o nosso país conseguiu implementar um protocolo de actuação, no SNS, sem prejuízo da objecção de consciência dos profissionais de saúde e da objecção dos hospitais privados. Os pedidos de eutanásia serão previsivelmente poucos. Criam uma opção, não dependem da existência ou não de Cuidados Paliativos, ainda que pressionem – e bem – no sentido de melhorar esses cuidados.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.