Era uma vez um primeiro-ministro que decidiu convocar um referendo que ninguém exigia sobre a permanência do seu país na União Europeia. Muitos tentaram desencorajá-lo, dizendo-lhe que não era necessário e que o risco de um resultado contrário ao pretendido era demasiado elevado porque poderia lançar o caos a nível político, económico e social. O primeiro-ministro não se impressionou e decidiu arriscar, convencido que ganharia o referendo e que seria lembrado por ter resolvido um problema ainda antes de este ter existido. Conhecido o resultado, demitiu-se e abandonou a política.

Um outro político, líder de um pequeno partido extremista conservador e eurocético, viu na convocação do dito referendo uma oportunidade para dar voz às suas dúvidas sobre a União Europeia. Habituado a representar minorias, nunca se convenceu que a sua voz pudesse tornar-se maioritária. Quando, numa madrugada eleitoral, percebeu que tinha ganho, renunciou ao seu cargo de líder partidário e desapareceu.

A este juntou-se um outro político, com fortes aspirações, que viu no processo do referendo uma plataforma para voos mais altos, assumindo protagonismo na defesa da saída da União Europeia. Conhecido o resultado, e aberta a vaga para o cargo de liderança do seu partido a que tanto aspirava, pareceu cair em si e retirou-se discretamente da corrida, preferindo um lugar de maior recato.

Surgiu então uma nova primeira-ministra que assumiu a responsabilidade de executar o resultado de um referendo que aprovou uma solução contrária àquela em que acreditava. Apressou-se a solicitar formalmente a saída da União Europeia, antes de ter um plano sobre como e quando sair. Vinculou o país a um calendário, contando que forçaria os deputados a uma solução devido à pressão resultante do avançar dos ponteiros do relógio. O dia, já calendarizado, está a chegar. E a solução?

O que há de comum nestes quatro políticos? Por enquanto, é apenas a circunstância de todos terem arriscado e perdido. Dentro de pouco tempo poderá ser também estarem todos retirados. Até os que saíram supostamente vencedores do referendo, saíram a perder. O que se passou a seguir revela que nem mesmo estes pretendiam verdadeiramente aquele resultado, mas apenas surfar a oportunidade que o debate representava. A política britânica recorda-nos de um sábio conselho tantas vezes repetido: não faças uma pergunta se não souberes como lidar com a resposta.