A reflexão que hoje partilho pode ser vista como parte de um díptico, que teve a sua primeira parte aqui no Jornal Económico há uma semana. Se então escrevi sobre o Seguro da Dignidade Individual, hoje debruço-me sobre a desejável evolução do Salário Mínimo Nacional. Em conjugação, cerio que ambos poderão ser impulsionadores de progresso social, de crescimento económico sustentável, de evolução e inovação na indústria e nos serviços.

Fruto da nossa cultura e organização económica e social, o salário mínimo é um garante inelienável de direitos básicos e um meio de regulação do trabalho que assegura, como a própria designação indica, mínimos. A questão fundamental a colocar é se conseguiremos máximos a partir de mínimos crónicos. Se asseguramos uma existência digna a famílias que subsistem com o salário mínimo. Se teremos trabalhadores motivados e produtividade de referência com base no salário mínimo. Se teremos retorno de capital à actividade económica com base no salário mínimo.

Tal como está concebido, o salário mínimo é um bordão para as empresas e uma asfixia para os trabalhadores. É compreensivelmente difícil para as empresas o compromisso com uma massa salarial fixa mais elevada, tendo que a cumprir independentemente da evolução da economia e do resultado da sua actividade. A Concertação Social é fundamental enquanto ponto de encontro privilegiado entre empregados e empregadores, e deverá ser sempre o centro da definição do salário mínimo nacional, que terá de existir sempre e acompanhar a evolução do custo de vida. Para lá da Concertação Social, deverá haver um papel estimulante e regulador do Estado, na maximização racional do salário mínimo.

A ideia da maximização do salário mínimo é simples, terá de o ser para ser facilmente implementada. Trata-se de prever uma alocação de parte dos lucros das empresas para retribuição salarial no exercício do ano seguinte. Esse aumento salarial variável em função do lucro da empresa terá de ser solidário, ou seja, como forma de compromisso e estímulo, a empresa deve ser isentada de contribuições e taxas sobre este montante, construindo-se um pacto triangular entre os trabalhadores, a empresa e o Estado.

A cada ano, as empresas pagarão o montante que poderão comportar, não se constituindo o montante variável em direito adquirido. Um mau ano, será mau para a empresa e para os trabalhadores, um bom ano será bom para todos. Não é dificil de prever um aumento significativo do compromisso do trabalhador com a empresa, traduzido em ganhos de produtividade, em mais participação na gestão do dia-a-dia, em mais partilha e sentimento de pertença. A determinação da percentagem de lucro a alocar deveria ser fixada em Concertação Social e ter valor de lei.

A par deste mecanismo, está implícita a obrigatoriedade de uma transparência na prática empresarial a que não estamos habituados. A participação e o empenhamento dos trabalhadores, bem como a regulação do Estado, implicam um nível de conhecimento que, pela filosofia de partilha, não deve resultar apenas do controlo da Autoridade Tributária. Decorre daqui uma racionalização dos salários do topo, adequando-os também à realidade do exercício das empresas, como já é prática corrente, por exemplo, na Alemanha.

Portugal precisa urgentemente de atenuar as enormes diferenças salariais que se verificam no mercado de trabalho. Os trabalhadores portugueses têm, em termos absolutos, salários que são manifestamente baixos, na maior parte dos casos, insuficientes. Não é fácil ter aumentos de produtividade sem um estímulo concreto para quem produz. Se é legítimo e lícito o investidor esperar lucro e retorno do seu investimento, é igualmente justo que haja um retorno de uma percentagem desse lucro para os factores produtivos, havendo lugar a uma compensação do Estado por essa renúncia. Com o regresso directo deste capital à economia, não é dificil antever mais emprego, mais segurança, mais bem-estar, mais criação de riqueza.

Ao contrário das ideias preconizadas pela esquerda, não se trata de opor empresários e trabalhadores, capital versus mão-de-obra. Só a direita, fundada em princípios já seculares e comprovados, pode ir beber à fonte inspiradora dos teorizadores da democracia-cristã, à exigente Doutrina Social da Igreja, juntar e conciliar sem dividir, e empreender esta necessária e absoluta revolução.

Tal como na provocação que aqui deixei na passada semana, falo apenas, e só, de vontade política, nada mais que vontade política. Quem a terá?

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.