Dar resposta aos problemas da nossa economia e sociedade, aos impactos negativos de fatores exógenos sobre Portugal (como a guerra que está em curso) e apoiar a reconstrução da Ucrânia constitui um triplo desafio para os próximos anos. A política de inovação será essencial para construir muitas dessas respostas, que terão de ser suportadas na criatividade, flexibilidade e resiliência do nosso sistema de inovação.
O primeiro desafio passa por adequar os instrumentos e prioridades existentes a um contexto pós-pandémico – que afetam a economia, o mercado de trabalho e a organização social – no sentido de acelerar a mudança da nossa estrutura produtiva para áreas de maior valor acrescentado e, ao mesmo tempo, diminuir as desigualdades e contribuir para um maior nível de bem-estar na sociedade em geral. Para tal, importa reforçar os investimentos previstos na ciência e tecnologia, consolidar os mecanismos de transferência e valorização tecnológica, qualificar a gestão empresarial, adequar os tempos e métodos de trabalho à nova realidade pós-pandemia, bem como dar maior ênfase à formação de jovens para as áreas tecnológicas (STEAM) e à requalificação de adultos.
O alcance destes objetivos requer que, em termos de política de inovação, haja uma forte e estreita articulação entre diferentes áreas governativas, nomeadamente as responsáveis pela digitalização (colocada, e muito bem, ao mais alto nível político), pela transição energética, pela inovação tecnológica e empresarial (com destaque para o papel importante que poderão ter os recém-criados Digital Innovation Hubs, as Zonas Livres Tecnológicas, os Centros de Tecnologia e Interface e os Laboratórios Colaborativos) e pela Ciência e Ensino Superior.
O segundo desafio da política de inovação por dar resposta aos impactos negativos que a invasão da Ucrânia pode ter sobre Portugal, em especial em áreas críticas como o agroalimentar ou a energia. Por exemplo, o desenvolvimento de novas tecnológicas ou a utilização da inteligência artificial poderão aumentar a produtividade no setor agrícola e acelerar a introdução de produtos alternativos na cadeia de produção, ajudando a atenuar o aumento de preços e a escassez de algumas matérias-primas a que já se está a assistir.
Pode ser o caso da utilização generalizada de biofertilizantes (e.g., à base de algas), que poderá colmatar uma possível escassez de fertilizantes no mercado, cujos maiores produtores mundiais são a Rússia e a China. Há em Portugal know-how nas nossas empresas nesta matéria (exemplo da Asfertglobal ou a Nutrofertil), bem como estão em desenvolvimento vários projetos experimentais, como é o caso do projeto ValSar, apoiado por fundos estruturais (Portugal 2020) e desenvolvido em consórcio entre a Universidade de Coimbra, a Escola Superior Agrária de Coimbra e o Centro de Interface CIIMAR.
Também a inteligência artificial pode ter um papel importante na redução dos custos de produção e aumento da produtividade, como o demonstram projetos como o IVDP Data +, na área dos vinhos (consórcio entre o Instituto dos Vinhos do Douro e Porto e Nova IMS) ou o projeto VirtuaCrop, em desenvolvimento por investigadores do IST (Universidade de Lisboa), para estimar a qualidade dos solos e produtividade das culturas a partir de dados de satélite.
O terceiro desafio ao qual a política de inovação pode dar resposta é ao esforço de reconstrução da Ucrânia, que deverá demorar vários anos.
Tendo a resposta imediata de Portugal sido mais na área humanitária e de apoio a algumas áreas concretas, como na formação, emprego e Ensino Superior (ver PortugalforUkraine), no período pós-guerra Portugal poderá mobilizar o que possui em termos de conhecimento e de inovação, presentes nas nossas infraestruturas tecnológicas, centros de I&D, nas start-ups e noutras empresas, no sentido de apoiar o aumento da capacidade de produção e de desenvolvimento tecnológico da Ucrânia, quase totalmente devastada pela invasão ainda em curso. Não só a Ucrânia sairá reforçada, como também a Europa e, consequentemente, Portugal.