Cresci a pensar que a política pode resolver problemas do dia a dia das pessoas. A vida ensinou-me que também os pode criar. Mas candidatei-me a deputado porque acredito que conseguimos fazer a diferença. Que cada debate, cada votação, cada legislação aprovada pode contribuir para fazer essa diferença. Por contribuir para resolver problemas.

2024 foi um ano exigente para a democracia portuguesa. Tivemos quatro eleições: regionais nos Açores e na Madeira, europeias e legislativas. Registámos, em eleições legislativas, a maior participação cívica desde 1995 – facto que nos responsabiliza a todos.

Recebemos dos eleitores um Parlamento mais fragmentado, com nove partidos, em que a construção de maiorias é desafiante e a negociação é uma constante necessidade.

Perante este cenário, muitos achavam que o Parlamento ficaria bloqueado e que a democracia não conseguiria responder. Felizmente, não tem sido assim.

Com institucionalismo e espírito negocial, tem sido possível assegurar a normalidade democrática: o Governo entrou em funções, o Orçamento foi aprovado e diferentes geometrias parlamentares têm conseguido aprovar iniciativas em várias áreas.

O Parlamento, com a sua diversidade de partidos e de ideias, não é um problema. É antes o lugar das soluções.

Não tenho receio da fragmentação partidária, das diferenças ideológicas, ou até de um certo vigor no debate público.

Como ouvi certa vez a Bernard-Henri Lévy, “em democracia, não devemos focar-nos apenas no que nos une. Mais importante, é preciso conhecer bem as nossas diferenças e a partir delas construir algo de comum”.

As diferenças importam, porque nos permitem estabelecer com honestidade o ponto de partida de cada um. Construir algo de novo a partir delas. Caminhar juntos, com lealdade, descobrindo um chão comum.

Numa palavra, é preciso bom senso.

Ao longo dos anos, habituei-me a ser prudente nas resoluções de Ano Novo. Não gosto de pedir demasiado. Mas, para este ano que agora começamos, julgo que posso pedir uma dose reforçada de bom senso.

Bom senso, desde logo, nas palavras e nos discursos.

Hoje o debate público no país está extremado, hiperbolizado. Debate-se o descongelamento dos salários dos políticos (o último corte do tempo da Troika que faltava reverter) como se fosse o expoente máximo da corrupção do regime. Assume-se que quem discorda deve estar capturado por interesses obscuros.

E país não é assim. As pessoas desejam liberdade, mas também segurança. Querem ordem pública, mas também tolerância.

Escolhem a prosperidade, mas não recusam a solidariedade social. Valorizam a autonomia individual, mas também a vida em comum.

Projetos radicais, destemperados têm pouca tração na sociedade portuguesa. Os portugueses são moderados e querem a paz social.

Ter bom senso também significa isto. Conhecer o país e a sua realidade.

Visitar o território, ouvir as pessoas, estimar e valorizar as comunidades locais.

Muitas vezes, parece que o discurso político anda longe da vida das pessoas. Adere mais facilmente a simplificações ideológicas. Ou até a projetos de engenharia social.

Os portugueses rejeitaram sempre essas pretensões. Preferem uma política realista. Preferem o bom senso.

O bom senso é preciso na ação política.

Nenhum de nós foi eleito para deixar tudo na mesma. E os portugueses deram-nos um Parlamento onde a ação, para acontecer, tem de ser concertada. Tem de ser negociada.

Precisamos de conversar mais e melhor.

Sobre uma reforma da Justiça que traga celeridade ao sistema e o faça comunicar eficazmente com os cidadãos.

Sobre uma política educativa que ofereça estabilidade aos alunos e autoridade aos professores.

Sobre uma alteração da lei das incompatibilidades que traga os melhores para a política.

Sobre uma política fiscal competitiva e estável, que ajude a economia a crescer.

Nestes como noutros domínios, as reformas far-se-ão por consenso, ou não se farão de todo.

O bom senso é necessário na política económica.

O país tem um tecido empresarial em que predominam as pequenas e médias empresas. Tem bons empresários, com capacidade de visão e audácia para correr riscos.

É preciso que as políticas públicas não os atrapalhem. Que não se deixem arrastar por discursos contra os empresários, mas saibam reconhecer que o sucesso das empresas portuguesas é necessário para o crescimento da economia como um todo.

O bom senso faz falta na política migratória. Os portugueses são instintivamente solidários e estão atentos aos dramas humanos de tantos refugiados e migrantes. Será sensata a política que souber articular o rigor com o humanismo; o controlo com a capacidade de acolher; o respeito pelo outro com a necessidade de integração na nossa cultura. E que assegurar, ao mesmo tempo, um combate firme às máfias de tráfico humano e à exploração económica dos migrantes.

Por fim, o bom senso é preciso na política externa. O papel de Portugal no mundo não é apenas nomear pessoas para cargos internacionais. É tomar o seu lugar no concerto das nações e usar a sua posição estratégica, a sua capacidade de construir pontes e o seu legado de luta pela democracia e pelos direitos humanos, para defender as suas causas e os seus interesses.

Dentro da União Europeia, Portugal deve apoiar o alargamento a leste, com datas concretas e um compromisso claro. Não podemos temer o alargamento, com o argumento de que nos fará perder fundos. Pelo contrário, a nossa ambição coletiva deve passar por deixarmos de precisar dos fundos comunitários, o que passa por repensarmos a nossa postura em matéria de coesão a médio prazo.

Quando olhamos para a União, não vemos apenas um financiador, ou um mercado único. Vemos um projeto político assente na democracia e na paz, na subsidiariedade e na defesa do bem comum. Estamos na Europa por convicção e não por mero interesse tático. É em nome dessa convicção que devemos defender o alargamento e contribuir para a construção europeia.

Com igual convicção – e bom senso – devemos também empenharmo-nos no reforço dos laços com os países-irmãos que partilham a nossa língua. É possível transformar afinidades culturais numa cooperação política mais estreita, voltada para o futuro.

Ao mesmo tempo, o lugar de Portugal no mundo passa pelas pessoas, designadamente pelos portugueses que vivem fora do nosso território. As nossas comunidades merecem que as instituições do Estado português, de forma concertada e estratégica, atuem, ainda mais, em prol da sua representatividade e defesa dos seus interesses lá fora, bem como no reforço contínuo da sua ligação a Portugal.

Chegamos a 2025 com o peso da História sobre os ombros. Há 50 anos, o país caminhava para as primeiras eleições livres. Há 40, ultimavam-se os preparativos para a adesão à CEE. Dois momentos que selaram o caminho de Portugal para a consolidação democrática e o desenvolvimento económico.

É justo recordar os estadistas que permitiram ao país trilhar este caminho. Mas a melhor homenagem que podemos tributar-lhes é sabermos estar à altura do seu legado. Estar, hoje também, à altura do seu bom senso.