Desde o início da legislatura que se esperava um crescer de problemas para um governo minoritário onde o primeiro-ministro António Costa sobranceiramente entendia poder governar, sem assumir formalmente uma maioria parlamentar estável. Se na legislatura anterior tal ficou consagrado no instrumento que forjou a geringonça, na atual, o PS entendeu que os seus parceiros iriam, em nome da esquerda, sufragar a sua estratégia solitária.

Cedo os ex-parceiros perceberam o seu espaço e a mais-valia do custo do seu voto. Jerónimo e Catarina, cada um à sua maneira, entenderam vender caro, muito caro, o seu apoio. E a grande oportunidade apresentou-se com o Orçamento para 2021.

Sem a habilidade e a experiência de Mário Centeno, sem a consistência política dos últimos cinco anos, no meio de uma crise pandémica e  às portas da presidência portuguesa da União Europeia, só a realização das eleições presidenciais podem impedir uma crise imediata e mais profunda. António Costa parece não ter aprendido a lição do pântano de Guterres, onde prevaleceu a fina inteligência política de Durão Barroso, preferindo acreditar que o apelo à estabilidade constitui condição suficiente para se manter.

Mesmo aprovado o Orçamento, este deverá ser o último da atual legislatura. O PS parece preparar-se para a estratégia da vitimização no próximo semestre, para espalhar os fundos europeus que entretanto cheguem a Portugal (atrasados por causa do episódio a Leste), e para tentar provocar eleições antecipadas em outubro do próximo ano, logo após as autárquicas.

Este é um Orçamento fragmentado, sem uma visão clara e com prazos difusos, exceto em patrocinar o Serviço Nacional de Saúde para travar a Covid e criar acrescidas respostas sociais numa manta de retalhos, em que os instrumentos existentes irão permitir que alguém, alguma vez, consiga sempre um apoio, um subsídio, uma resposta, senão mesmo, ter acesso a várias em simultâneo.

O tecido económico entretanto definha, nas migalhas dos apoios cuja burocracia impede a resposta eficaz, perante as insolvências anunciadas, apenas ultrapassada pelos sucessivos anúncios governamentais de medidas que, pelo seu número, devem sugar o que sobrar do Orçamento do Estado.

Estão pois  criadas as circunstâncias da justificação para o aumento do défice e da dívida, da falta de medidas estruturais e de futuro, onde os planos de recuperação económica têm apenas “visão estratégica” mas não têm sustentação política, nem recursos financeiros visíveis.

Um dos pressupostos que Comissão Europeia exige é a realização de reformas estruturais como contrapartida para os financiamentos necessários. Ora, para realizar reformas é necessária uma maioria parlamentar estável que o PS não tem, nem se mostra capaz de criar.

Por isso, este Orçamento pode constituir apenas a carta de alforria até às próximas eleições. E não será a oposição que vai derrubar o Governo. Será o líder do PS que irá provocar a queda para não ficar manietado nas malhas dos votos da esquerda que não lhe dá o que pretende, nem da direita que não lhe dará o que não merece.