Na discussão do Orçamento do Estado, os partidos políticos querem fazer-nos crer que existem alternativas ideológicas muito diferentes. Mas, de facto, para Portugal, as opções de política macroeconómica à disposição do Governo são meramente decorativas.
Perante problemas de crescimento económico, os países podem, em tese, recorrer a instrumentos de política monetária e fiscal. Porém, nos países do euro a situação é diferente. A política monetária pertence ao Banco Central Europeu, pelo que apenas resta aos países a política fiscal. Em Portugal, já nem esse reduto temos.
Com a intervenção da ‘troika’ ficou muito limitada a margem política e constitucional para reformas difíceis e mais austeridade, e com a dívida pública em cerca de 130% do PIB não pode haver mais investimento público. É assim praticamente impossível para o Governo resolver de forma rápida o nosso problema de crescimento. As grandes opções macroeconómicas com impacto significativo já não estão ao nosso dispor e dependem dos órgãos da União Europeia (UE) e das outras democracias da zona euro.
É certo que é possível implementar reformas na educação, na ciência e na justiça, mas os retornos a este nível apenas se manifestam a longo prazo. É certo que podem criar-se inovações fiscais, mais ou menos redistributivas, e poupar-se aqui e ali, mas de pouco ou nada serve face ao “elephant in the room”: a dívida e os problemas estruturais do euro.
Os partidos do arco da governação sabem isto. No entanto, o PSD e o CDS distraem-nos com o tema da falta de confiança externa e da despesa pública. O PS distrai-nos com a reposição de rendimentos. No fundo, todos sabem que os debates realmente relevantes são os da integração europeia: a mutualização da dívida, a união bancária, a harmonização fiscal, etc.
Assim, é bastante estéril e hipócrita um debate excessivamente ideológico à volta do Orçamento do Estado. As soluções encontradas, por mais engenhosas e criativas (que foram), acabam sempre por se resumir a contas de merceeiro, pois não resta outra opção ao Governo do que cumprir o défice acordado com a Comissão Europeia e controlar a dívida pública – basta olhar para o revolucionário domesticado Alexis Tsipras.
A UE e o euro são, para o bem e para o mal, um colete-de-forças ideológico, monetário e fiscal. Se os problemas estruturais do euro não forem resolvidos, a tensão vai crescer e crescer até o colete rebentar. Mas qual é a verdadeira capacidade que temos de manter este colete numa Europa tão diversa e com problemas estruturais tão profundos?
Viver num espaço de paz, liberdade e justiça social com 500 milhões de cidadãos, com uma riqueza cultural ímpar, sem grandes agitações ideológicas, pertencer ao maior mercado único do mundo, onde todas as empresas concorrem em ‘fair play’, estudar e trabalhar em diferentes países é um sonho pelo qual emigrantes e refugiados não europeus estão dispostos a arriscar vida. E nós que vivemos aqui? O que estamos dispostos a arriscar? Uma coisa é certa, para manter o sonho, como diz Stiglitz, ou recuamos ou avançamos, onde estamos não podemos ficar.