Ao olharmos para o mundo também não se imagina uma muito melhor pintura, embora apareça uma superpotência, a China, a destacar-se, com objectivos bem traçados num Horizonte de longo prazo e dando a impressão que sabe (por se ter preparado) por e para onde caminhar.
Numa sua mensagem a coincidir com o início do Ano Novo Gregoriano (o ano chinês só acontece a 5 de Fevereiro próximo), Xi Jinping foi afirmativo: “o ritmo das nossas reformas não vai marcar passo, e a nossa abertura vai aumentar”, ou seja, apesar da complexidade do actual ambiente geopolítico global, a economia chinesa vai continuar a abrir-se ao mundo.
Este meu primeiro comentário no Jornal Económico “de arrepio” sobre as perspectivas políticas e económicas na União Europeia (UE) em 2019 pode imprimir a sua primeira marca (já sem falar no Brexit) nos resultados eleitorais de Maio próximo: o avanço significativo do populismo e da extrema-direita. E, a partir daí, um terreno bem cultivado para um movimento europeu e internacional de extrema-direita, mais formal ou informal, bem ou melhor organizado, se implantar e consolidar.
As condições sedimentadas na Europa apontam nessa direcção. Não temos um único país europeu dos Grandes (determinantes na política da UE) e grande parte dos pequenos e mais pequenos, com um mínimo de estabilidade. Encontram-se, na sua maioria, “desengonçados”, sem identidade, por esta ou aquela razão. Em situação de turbulência latente ou evidente.
A Alemanha baloiça por tudo quanto é lado. A política de refugiados de Merkel abriu fissuras na sociedade alemã. A direita tradicional (cristã) está em crise, o SPD em definhamento lento mas constante. Assim, a organização política tradicional do país esboroou-se, deixando caminho livre para o populismo e a extrema-direita aparecerem e consolidarem-se de forma significativa.
Merkel, na sua mensagem de Ano Novo, 2019, parece ter saído de um sonho a dizer que a Alemanha “deve assumir mais responsabilidade na arena internacional”. Será que o seu sonho de assumir “mais responsabilidade” também se destina ao interior da Europa? Será que vai ter efeitos no avanço estrutural da Europa?
Não menos importante, será desta que Merkel vai ser decisiva (e tem poder para isso) na redução das assimetrias existentes e que se auto-reproduzem, condicionando o desenvolvimento de muitos dos países no seio da UE e da União no seu todo? Por exemplo, as assimetrias no acesso ao financiamento. A Alemanha pode financiar-se a uma taxa de juro inferior a 1%, pois o euro funciona para a Alemanha como uma moeda fraca, enquanto para Portugal e outros países o euro é uma moeda cara, com taxas de juros muito superiores. Será que é este o tipo de responsabilidades que Merkel tem em mente?!
A França, em termos de sociedade política, já se tinha “desmembrado” nas últimas eleições, com o quase desaparecimento dos partidos tradicionais e a ascensão fulgurante de Macron. Mas, agora, com “os coletes amarelos” Macron quase se afogou. Sobrevive à tona de água. Por e para onde vai a França? Uma grande incerteza. Esta situação deixa terreno fértil para mais uns avanços consolidados da organização de Marine Le Pen, aquela que não tem sido tocada e passo a passo vai avançando. Quem sabe se, nesta nova conjuntura, dará passos muito firmes…!
Da Itália pouco a dizer. Um governo contranatura. Uma sociedade “baralhada” com as suas persistentes e grandes desigualdades de desenvolvimento económico e social norte/sul, e uma tremenda desestruturação política em profundo “banho-maria”. Já dispõe de várias hipóteses de reestruturação política, mas a sua incapacidade tem sido uma constante.
Temos ainda, ao nível de grandes, a Espanha e a Polónia.
A Espanha já tinha e tem a sua turbulência estrutural com os diferentes poderes autonómicos, nomeadamente a Catalunha, nos tempos mais recentes. Vê agora chegar ao palco um novo fenómeno, o populismo de extrema-direita, e logo a ter influência decisiva na constituição do novo poder político da Andaluzia, afastando o PSOE que, desde a mudança franquista, sempre foi o senhor daquela região.
A Polónia é um dos casos da UE de democracia limitada com a comunicação social em situação de quase clandestinidade, com culpas claras da União que não aplica as suas próprias decisões. Outro foco de grande instabilidade.
E a baralhar isto tudo, só falta mesmo o Brexit, cujos cenários de desfecho são muito complexos com efeitos imprevisíveis em todo o continente europeu.
Os países médios e pequenos têm os seus problemas. Uns mais, outros menos. Apesar disso em alguns existe alguma estabilidade, ou de outra forma, menor instabilidade. Será que poderão estes países de dimensão menor desempenhar algum papel positivo no “reanimar” da UE?
As esperanças são poucas, em minha opinião, pois na União Europeia parece não haver aquele mínimo de coerência entre os países e de discussão tendente a soluções adequadas, praticamente a nenhum nível. Já se aperceberam que as decisões europeias são tomadas sempre sob pressão às tantas da madrugada e nunca na base de uma discussão sólida?! Isto deve ser patológico.
A UE, como costuma marchar, não avança. Tem de mudar de treinadores de marcha. As reformas não se vêem nem sequer se pode dizer que se arrastam, pois não se movem. No entanto, há países que enriquecem à custa de outros no seio da União. Basta pensar no caso do euro fraco para uns e caro para outros. Daí que esta Europa serve alguns.
A UE tem sobre si a culpa desta tendência de movimentos para o populismo e extrema-direita e da estagnação e perda de poder nos últimos tempos, no contexto mundial.
A UE não convence os europeus da sua bondade de futuro.
Esta linha de continuidade, esta forma de agir dos principais dirigentes e políticos da União, e nomeadamente dos países maiores, não se enquadra nos princípios que estiveram no arranque desta Instituição. Cada dia que passa, a paz e o entendimento entre os países europeus estremecem, tornando-se bem periclitantes.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.