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Onde pôr o risco? Três forças que vão redefinir as carteiras

Tarifas, tecnologia e taxas são as três forças que vão formatar carteiras de investimento no que resta de 2025 e no próximo ano. A inteligência artificial e a energia para a alimentar são centrais.
2 Novembro 2025, 18h00

Em Sines, a cidade da costa alentejana com menos de 15 mil habitantes, banhada pelo frio Atlântico, encontra-se o exemplo das forças que estão a moldar as estratégias globais de investimento. A Start Campus inaugurou este ano o SIN01, o primeiro de seis módulos do seu hyperscaler, um centro de dados com grande escala, num investimento internacional da Davidson Kempner Capital Management e da Pioneer Point Partners. Tem capacidade para 31MW, o equivalente a todo o parque residencial de Braga. O segundo chegará aos 180MW e os restantes a 240MW.

No final, terão sido investidos 8,5 mil milhões de euros, com capacidade para atrair outros 30 mil milhões em equipamento. Terá 1,2GW de capacidade instalada, que consumirá tanta energia como o Luxemburgo, mas totalmente renovável.

Sines é um ponto estratégico com ligações de fibra ótica a quatro continentes e o objetivo declarado é captar investimento em inteligência artificial (IA), como o da Nscale, que vai instalar 12.600 unidades de processamento de grande capacidade da Nvidia para apoiar a Microsoft no fornecimento de recursos avançados de IA em toda a União Europeia.

É assim que na região mais ocidental da Europa confluem três tendências que definem o investimento global em 2026: a convergência entre energia, tecnologia e infraestruturas críticas. É nesse cruzamento que se joga a próxima década de retornos.

Os centros de dados, que há cinco anos eram ativos de nicho, tornaram-se motores de investimento estratégico. O Goldman Sachs prevê que a procura global de capacidade de computação associada à IA duplique entre este ano e o próximo, o que significa redes elétricas mais robustas, interligações internacionais e armazenamento em larga escala.

Obrigações e dívida soberana estão a deixar de oferecer o benefício que tinham em ciclos de taxas elevadas porque o rendimento futuro está a descer. O Bank of America alerta que “a compressão do prémio de risco em dívida pública vai reduzir o apetite dos investidores”. As yields de longo prazo vão reduzir-se.

À medida que o retorno dos títulos de dívida desce, o capital procura refúgio em ativos que combinem estabilidade com crescimento real.

Dar corpo ao digital

Nas ações, a liderança pertence às empresas que ligam o mundo físico ao digital, prevendo-se encontrar vencedores nos cruzamentos entre computação e energia, entre automação e rede elétrica, entre telecomunicações e armazenamento. A Goldman Sachs recomenda “sobreponderar utilities e tecnologia de infraestruturas”, enquanto o JP Morgan identifica “as empresas que alimentam a IA — fabricantes de chips, operadores de rede e produtores de energias renováveis — como o núcleo do próximo ciclo de lucros”. É o caso de gigantes como a Nvidia e a TSMC, mas também de operadores europeus como a Enel ou a Iberdrola, que agora disputam contratos diretos com centros de dados.

O investimento em energia será menos uma questão de transição e mais de segurança. A eletricidade tornou-se o ativo estratégico da economia digital. O Deutsche Bank estima que “a procura energética dos centros de dados globais possa duplicar até 2026”, exigindo “investimento público e privado massivo em linhas de transmissão, armazenamento e regulação da oferta”. Na prática, o investidor que em 2024 comprava obrigações, em 2026 estará a financiar cabos de alta tensão, turbinas eólicas e baterias de lítio.

Nas matérias-primas, cobre, alumínio e urânio permanecem o tripé estrutural da próxima fase do investimento industrial. O cobre continua escasso: calcula-se que o défice global poderá superar 1,2 milhões de toneladas em 2026, impulsionado pela eletrificação e pelos projetos de energia eólica e solar. O alumínio ganha relevância com a descarbonização do transporte e da construção. O urânio regressa com força, sustentado pelo relançamento da energia nuclear na Europa e no Japão.

O ouro mantém-se como proteção — “um seguro barato num mundo em fragmentação”, como define o Bank of America.

O crédito privado e as infraestruturas essenciais estão a captar o capital que sai das obrigações. O private credit oferece rendimentos ajustados ao risco, menos sensíveis às decisões dos bancos centrais. A infraestrutura, especialmente redes elétricas, fibra ótica e centros de dados regionais, conjuga estabilidade regulatória e procura de longo prazo. “O défice de investimento em infraestrutura energética e digital na Europa é uma oportunidade geracional”, resume o Deutsche Bank.

Localização, localização

A geografia dita o contexto. Os Estados Unidos continuam o principal motor de inovação e de lucros, mas a instabilidade fiscal e tarifária pode limitar margens. A Europa ganha importância relativa pela estabilidade regulatória e pela concentração de capital em setores essenciais — energia, transportes, comunicações. O sudeste asiático, em especial o Vietname, a Malásia e a Indonésia, torna-se destino preferido da relocalização industrial, com a instalação de fábricas de semicondutores e centros de dados em regiões com energia barata e políticas previsíveis. A China mantém um papel central no consumo e nas matérias-primas, mas perde o monopólio da produção global.

A OCDE projeta que o crescimento mundial estabilize em 3,3% em 2026, com os Estados Unidos a crescerem 2,4%, a zona euro 1,5% e a Ásia acima de 5%. Esta assimetria obriga o investidor a combinar geografias complementares: a robustez americana, o valor europeu e o dinamismo asiático. Ainda que o Barclays aponte que “as políticas comerciais podem ser o maior risco para a economia desde 2018”.

O próximo será um ano de maturação para as tendências iniciadas agora: taxas mais baixas, obrigações menos atrativas e capital em busca de crescimento produtivo. Centros de dados, energia e tecnologia serão o coração do novo mapa de investimento. Porque, no fim, investir não será escolher entre risco e segurança — será escolher o que resiste ao tempo. E o tempo continua a ser a única variável que nunca falha.


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