Já se encontra em vigor a Lei que altera o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa e estabelecimento e cujo nascimento se deve aos acontecimentos do passado ano de 2017 na PT/Altice.
Muito se tem falado sobre a grande novidade do regime: foi consagrada expressamente a possibilidade do trabalhador em se opor “à transmissão do empregador no seu contrato de trabalho em caso de transmissão, cessão ou reversão de empresa ou estabelecimento, ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica”.
Sucede que este direito do trabalhador carece do cumprimento de diversos requisitos:
A oposição só será considerada válida se o trabalhador demonstrar que a transmissão lhe pode causar “prejuízo sério”, sendo que se entende por prejuízo sério, nomeadamente, a “manifesta falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente ou, ainda, se a política de organização do trabalho deste não lhe merecer confiança”.
Ora, dispondo o trabalhador de apenas cinco dias úteis para se opor à transmissão, não se descodifica como pretende o Legislador que este consiga recolher os elementos necessários que lhe permitam demonstrar a existência de um prejuízo sério.
Ainda menos se compreende a escolha dos exemplos apresentados pelo Legislador para fundamentar essa oposição. Como é que o trabalhador demonstra a falta de confiança na política de organização do trabalho do adquirente? Na verdade, em que se traduz essa falta de confiança? Variará de acordo com a cor política do trabalhador? Como se pretende que o trabalhador tenha conhecimento da política de organização do trabalho da aquirente (fora dos casos em que estejam em causa grandes empresas ou processos mediáticos como o da PT/Altice)? Como é que o trabalhador vai avaliar a solvabilidade ou situação financeira da adquirente?
Não devia o Legislador ter previsto a obrigatoriedade do adquirente e transmitente facultarem aos trabalhadores a política de organização do trabalho e, ainda, os relatórios financeiros dos últimos anos? Parece-nos que sim. Parece-nos, também, que devia ter sido estipulado um prazo de resposta por parte do adquirente e do transmitente, cujo objetivo seria rebater os argumentos apresentados pelo trabalhador e quiçá fazê-lo mudar de opinião, aceitando a transmissão.
Nas situações em que o trabalhador se opõe à transmissão fica vedada a possibilidade do contrato de trabalho ser transmitido, mantendo-se o vínculo contratual com o transmitente. Ora, se o único estabelecimento da sociedade for aquele que é transmitido, não é difícil perceber que a manutenção do vínculo laboral não será algo que durará muito tempo, uma vez que o contrato acabará por cessar, nomeadamente, por via do encerramento da empresa/estabelecimento.
Se o transmitente, apesar da oposição expressa do trabalhador, ainda assim, decidir transmitir o contrato de trabalho, foi agora consagrada expressamente a possibilidade do trabalhador resolver com justa causa o contrato de trabalho.
Se a resolução não for aceite pelo empregador (o que deverá ocorrer na maioria das situações), o trabalhador será obrigado a recorrer aos Tribunais (no prazo de 30 dias a contar da transmissão) para que estes reconheçam a validade da resolução anteriormente operada (caso a mesma seja declarada lícita, o trabalhador terá direito a uma compensação correspondente a 12 dias de antiguidade) e terá ainda (com a interposição da ação) acesso ao subsídio de desemprego (partindo do pressuposto que estão cumpridos os demais requisitos formais).
Aqueles que rejubilam com a alteração do regime devido à possibilidade do trabalhador se opor à transmissão do seu contrato de trabalho, certamente ainda não se aperceberam que este direito do trabalhador está sujeito ao cumprimento de difíceis (para não dizer inexequíveis) requisitos formais e substanciais.