O Iniciativa Liberal (IL) tem traços que o tornam uma espécie de gémeo dizigótico do Bloco de Esquerda (BE). Sociologicamente, ambos têm uma militância predominantemente urbana e com formação superior, não raras vezes bem nascida.

Quanto à aparência, os liberais, tal como os bloquistas, fazem questão de trajar em desafio às convenções burguesas. Se estes últimos adoptaram um look estudadamente descuidado, contestatário dos ditames da moda – tida por fútil e capitalista –, os primeiros apresentam-se habitualmente com uma indumentária smart casual, despidos da circunspecta e respeitável gravata, inspirados no estilo do executivo em fim-de-semana.

Na propaganda, o IL aposta – tal como o BE apostou antes de se investir de uma certa gravitas que o crescimento eleitoral e a aproximação ao poder recomendaram – em campanhas eleitorais irreverentes e jocosas e em iniciativas políticas heterodoxas, particularmente bem acolhidas pelo eleitorado jovem, um dos seus alvos eleitorais. Se o BE tem por hábito organizar acampamentos de verão, onde se cantam as utopias libertadoras ao ritmo dos djambés, o IL optou pelo arraial do orgulho liberal e pelo apelo à desobediência civil, anunciado – embora não concretizado – por Tiago Mayan Gonçalves, visando combater o pretenso regime de fascismo sanitário em vigência.

Em sede parlamentar, o IL dá-se ao luxo da irresponsabilidade, beneficiando da exiguidade da sua representação, tal como os bloquistas o haviam feito quando não tinham mais que uma mão cheia de deputados. Cientes de que o seu único voto não conta para a aritmética parlamentar, os liberais puderam votar repetidas vezes contra o decreto do estado de emergência, na certeza de não terem que assumir o ónus, seguramente pesado, do seu chumbo.

Quanto aos assuntos de cariz moral, as parecenças entre os dois partidos são também notórias. Tome-se como exemplo a eutanásia, que ambos apoiaram, embora por motivos diferentes. O Bloco fê-lo em nome do relativismo ético, que recusa qualquer inibição à livre escolha no domínio moral, sobretudo porque nele prevalecem entre nós os valores de inspiração cristã. Os liberais, por seu turno, porque vêem na eutanásia uma forma mais de retirar ao Estado o poder de decisão sobre os indivíduos.

O IL apresenta-se, no fim de contas, como o mano de direita do BE. Dando-se ares modernos e cosmopolitas, com o objectivo de acentuar o contraste com a direita tradicional, conservadora e avessa ao activismo, na qual muitos dos seus membros terão a suas origens, os liberais procedem do mesmo modo que o BE nos seus primeiros anos, que se afirmou na cena política como contraponto colorido do sisudo e disciplinado PCP, partido no qual haviam militado alguns dos seus notáveis.

Em suma, o IL é a direita que deixou de ir à missa.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.