Uma das questões mais controversas no conflito entre Israel e o Hamas é a da utilização dos civis como escudo humano. Na verdade, tem surgido a evidência de que o Hamas infiltrou a sua capacidade entre a população civil em Gaza, através de um sofisticado sistema de túneis, numa região de elevadíssima concentração populacional. Em especial, tem sido sublinhado o facto de essa infiltração se dar em unidades civis, de que é exemplo o hospital de Gaza.
O Direito Internacional condena, de forma muito clara, a utilização de civis como escudos humanos, a infiltração de capacidade operacional militar em infraestruturas civis e o uso destas, em particular hospitais, como elementos de proteção de equipamento militar.
Assim, por exemplo, estabelece-se no n.º 4 do artigo 12 do Protocolo I adicional às Convenções de Genebra que “as unidades sanitárias não deverão em qualquer circunstância ser utilizadas para tentar colocar objetivos militares ao abrigo de ataques. Sempre que possível, as Partes no conflito procurarão situar as unidades sanitárias de maneira que os ataques contra objetivos militares não ponham aquelas em perigo”.
E acrescenta-se, no artigo 13, que “a proteção devida às unidades sanitárias civis apenas poderá cessar se aquelas forem utilizadas para cometer, fora do seu objetivo humanitário, atos nocivos ao inimigo. No entanto, a proteção cessará somente quando uma notificação, fixando, sempre que a tal houver lugar, um prazo razoável, ficar sem efeito”.
Por outro lado, de acordo com o artigo 8º do Estatuto de Roma que criou o Tribunal Penal Internacional, é crime de guerra “aproveitar a presença de civis ou de outras pessoas protegidas para evitar que determinados pontos, zonas ou forças militares sejam alvo de operações militares”.
Recorde-se que a Palestina tinha aceitado a jurisdição do Tribunal Penal Internacional, tendo ratificado o Estatuto de Roma em 2015, pelo que o TPI tem jurisdição no seu território. Aliás, o seu procurador-geral proferiu já declarações, afirmando que o Tribunal se encontra atento ao que está a ocorrer em Gaza, praticado por ambas as partes, e reafirmou a jurisdição do Tribunal relativamente aquele território.
Deste modo, e com acesso muito difícil à informação neste momento, comprovando-se a utilização de civis como escudos humanos em Gaza, assim procurando dissuadir a reação armada em legítima defesa, visando aumentar as baixas entre civis e dificultar a libertação dos reféns, isso constitui uma grave violação do Direito Internacional, em especial do Direito Internacional Humanitário, e pode constituir um crime internacional, punido nos termos do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional o qual possui, como se viu, jurisdição sobre aquele território.