O investimento da esquerda na sedução e sustento de elites intelectuais à volta do mundo, pode considerar-se das melhores apostas políticas algumas vez feitas. Mais do que a política, a acção cultural condiciona o rumo que as sociedades vão tomando e o seu comportamento. Grandes escritores, pintores de vanguarda, poetas de excepção, filósofos de referência, sociólogos de grande projecção, músicos populares formam um eficaz círculo de condicionamento social, impondo o que se deve, ou não, pensar a cada momento. O dito engajamento é visto como natural, desejável e mesmo um pré-requesito para aceitação e sucesso.

Se estabelecermos uma hierarquia do horror do século XX e século XXI, não é preciso máquina de calcular para afirmar com certeza que o comunismo e as diferentes derivações do socialismo protagonizaram as maiores atrocidades, os mais graves crimes contra a humanidade, as ditaduras mais sanguinárias e os genocídios mais brutais.

Ainda assim, a academia, o sistema de ensino e a opinião publicada reduzem os males da humanidade ao nacional-socialismo, ao fascismo e ao autoritarismo conservador ibérico, conseguindo ligar tudo ao espectro alargado da direita actual. É impossível tentar explicar a uma plateia alargada a maior proximidade de Mussolini a  princípios da esquerda clássica, bem como há pouca vontade de interpretar seriamente as razões profundas do pacto Ribbentrop-Molotov que uniu Hitler e Estaline.

A direita actual é herdeira directa da democracia-cristã, do conservadorismo inglês e do liberalismo anglo-saxónico, nada a liga a nenhum dos grandes vilões do últimos cem anos. Porque vive então condicionada por esta narrativa fabricada pelas diferentes correntes marxistas que têm fustigado o mundo?

Neste acantonamento cultural, a direita divide-se em três grandes grupos. O primeiro grupo ignora as áreas culturais e sociais, entricheirando-se na economia como mola única de impulso social e civilizacional, ou seja, o progresso pela geração de dinheiro. O segundo grande grupo defende uma visão conservadora do mundo, fundada no humanismo clássico, ancorada em valores perenes e com uma visão holística do equilibrio e progresso social. O terceiro grupo, aquele que é verdadeiramente perigoso, vive na direita a sonhar com a esquerda. Interiorizou o complexo induzido da superioridade moral, cultural e social da esquerda, em absoluto contraste com a realidade e a história. Vive perdido numa necessidade de reconhecimento pelo inimigo que, ao fim do dia, o dilacera sem piedade.

A direita portuguesa que é titular de cargos institucionais no presente encontra-se maioritariamente no terceiro grupo. Algo vai muito mal quando um grupo de pessoas ditas de direita se organiza com o objectivo de vir esclarecer que não é socialista, ainda que as razões mais profundas de organização sejam bem mais comezinhas e unipessoais. Alguma coisa não bate certo quando quem diz querer liderar a direita alinha com a esquerda em questões fundamentais e fracturantes, ou pede desculpas públicas ao guerrilheiro inimigo por uma putativa ofensa de que não é responsável.

Há um enorme equívoco quando a direita engole acrítica o embuste que a esquerda vende há mais de um século, uma sucata velha travestida de modernidade, uma hipocrisia sem fim, um cinismo sem limites. A ânsia desta direita é, aparentemente, ser de esquerda. Quem vive neste conflito, não é capaz de fiscalizar e ser alternativa real à esquerda. Só assim se explica a extravagância dos resultados das diferentes sondagens e estudos de opinião portugueses.

Este clima de branqueamento e impunidade cedo ou tarde resvala para casos como o do maior nepotismo no Estado desde que há memória. Apesar da transmissão familiar regulada e prevista, não terá havido nas cortes do passado a promiscuidade familiar que existe no Governo socialista da geringonça. Esta endogamia e concentração absoluta de poder, em tudo nefasta para o Estado de direito democrático, só acontece por falta de escrútinio, pela interiorização de um despotismo inquestionável por parte dos seus protagonistas.

O Estado está sob ataque e a Democracia está doente; este escândalo, que entretanto se tornou chaga aos olhos do mundo, desprestigia Portugal e as suas Instituições. A esquerda tem a culpa, como os seus camaradas tiveram de tanto ao longo da história. A direita que vive com medo de ser direita, ou a fingir que é direita, será irremediavelmente cúmplice.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.