Num mundo em que a guerra reescreve diariamente as regras da segurança e defesa, os drones deixaram de ser brinquedos para se tornarem os olhos, a inteligência e o braço armado das operações militares e civis.

Na Ucrânia, desde o primeiro dia da invasão, drones comerciais e militares pulverizaram doutrinas rígidas e ultrapassadas, obrigando os comandantes a repensar tudo – da logística à estratégia de combate. No Donbass, vigiar e atacar é, hoje, a definição mais crua de poder. E Portugal? Continuaremos a assistir de braços cruzados? Não nos enganemos: os drones não são apenas o futuro da guerra, mas já constituem a espinha dorsal da segurança quotidiana.

Na Dinamarca, aeroportos como Aalborg e Copenhaga foram forçados a encerrar devido à intrusão de drones não autorizados sobre infraestruturas críticas – ataques híbridos que interrompem a vida normal, causam prejuízos económicos avultados e espalham medo, exigindo contramedidas imediatas.

Não é apenas um problema da Dinamarca. É um alarme ensurdecedor para Portugal. Quantas das nossas infraestruturas críticas, aeroportos, portos, centrais elétricas ou até as bases militares estão realmente preparados para enfrentar esta nova ameaça?

Em território nacional, as forças de segurança e a proteção civil já recorrem esporadicamente a veículos não tripulados – aéreos (UAVs), terrestres (UGVs) e marítimos (USVs) – para salvar vidas, monitorizar incêndios e patrulhar áreas sensíveis. Mas usar tecnologia alheia é uma coisa; dominá-la e desenvolvê-la é outra. E aqui Portugal tem um trunfo que não pode ser desperdiçado.

A Tekever, referência mundial, com drones como o AR3 e o AR5 – usados até na Ucrânia – exporta 99,9% da produção e duplicou receitas em 2024. A Beyond Vision, fornecedora de sistemas já vendidos para Itália e Ucrânia, comprova a capacidade de inovação nacional. A POST77, empresa em que o fundador da Tekever é atualmente CTO, aposta na integração de inteligência artificial para controlo de enxames de drones, soluções já no radar da NATO.

Este conjunto de empresas é a prova viva de um ecossistema industrial em ascensão, mas ainda sem apoio estratégico do Estado. Se não for protegido e potenciado, arrisca-se a definhar e a deixar Portugal na periferia desta revolução tecnológica. Onde está a visão estratégica?

O Estado, as Forças Armadas e as Forças e Serviços de Segurança têm de investir de forma séria em investigação e desenvolvimento (I&D) no setor dos drones. Não basta comprar tecnologia; é necessário criá-la.

É urgente formar unidades especializadas em drones – aéreos, terrestres e marítimos – nas Forças Armadas, nas polícias e na proteção civil, com treino dedicado a operações híbridas, contramedidas anti-drone e integração de IA. O exercício REPMUS, liderado pela Marinha Portuguesa, já demonstrou que sabemos testar estas tecnologias com os melhores do mundo. Por que não liderar também?

Olhemos para o mar. A nossa Zona Económica Exclusiva, uma das maiores da Europa, é um ativo estratégico frágil, e é assim bem mais do que um cluster económico, exposto à pesca ilegal, ao tráfico ilícito e às ameaças híbridas, que só podem ser enfrentadas com mais eficiência com meios não tripulados em rede. Vamos continuar a importar tecnologia enquanto o talento português definha por falta de investimento?

Portugal liderou os mares no passado. Hoje, a soberania joga-se no ar, em terra e no mar, com sistemas não tripulados que redefinem o poder. Ignorar o cluster industrial emergente – Tekever, Beyond Vision, POST77, etc. – é abdicar da nossa relevância num mundo em convulsão.

Senhores decisores, a equação é simples: ou investimos em I&D e em unidades especializadas, ou ficaremos dependentes de outros. Os drones não são o futuro distante. São o presente e são a ponta do icebergue.